Baseado em uma história real, A Libertação é um dos novos lançamentos de terror da Netflix. Dirigido por Lee Daniels, diretor de Preciosa (2009), o filme tem chamado a atenção do público.
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Contando a história de uma família que afirma estar sendo importunada por demônios, o longa teve um lançamento limitado nos cinemas norte-americanos em 16 agosto e chegou às plataformas de streaming no dia 30 do mesmo mês.
Mas o que tem feito o público se interessar especialmente por essa história? A Macabra te conta um pouquinho sobre a produção.
O filme
Ebony (Andra Day) se muda para uma nova redondeza com seus três filhos, Andre (Anthony B. Jenkins), Nate (Caleb McLaughlin) e Shante (Demi Singleton), e sua mãe, Alberta (Glenn Close), que está passando por um tratamento de câncer. O pai das crianças, ficamos sabendo, está no Iraque.
Ebony é uma mulher que não leva desaforos para casa, firme e bastante dura, mas que parece amar seus filhos. Já as crianças não são fáceis de lidar, e sua relação com a mãe não é das melhores. Com Alberta, também, Ebony não se dá muito bem.
Quando coisas estranhas começam a acontecer em sua casa nova, Ebony fica sem saber como lidar com a situação. Ela é chamada no hospital com urgência após ocorrências aterrorizantes na escola das crianças terem feito com que elas fossem enviadas para alguns exames, seus filhos tentam matar uns aos outros, sonambulismo. Entre vários eventos isolados, Alberta começa a perceber que há algo errado. Mas poucos acreditam nelas. Até o momento em que outras pessoas passam a presenciar as ocorrências.
Baseado em uma história real
A Libertação é um filme baseado em uma história real. Em novembro de 2011, Latoya Ammons, seus três filhos e sua mãe, Rosa Campbell, se mudaram para uma casa alugada na pequena cidade de Gary, Indiana. Desde que se mudaram, Latoya contou que ela e Rosa ouviram muitos barulhos pela casa no período noturno — passos andando pelo porão em direção às escadas, portas rangendo como se estivessem tentando abri-las.
Outras situações bem estranhas começaram a acontecer. Certo dia, Rosa acordou e viu uma figura nas sombras andando na sala de estar. Quando se levantou e foi conferir, pegadas molhadas de botas estavam espalhadas pelo chão. Depois de algum tempo, Latoya acordava de madrugada e afirmou ter encontrado seus filhos levitando acima de suas camas, sendo arremessadas nas paredes e machucadas por “objetos voadores”.
Apesar de terem procurado ajuda, inclusive em igrejas, poucos realmente aceitaram ouvir as queixas das mulheres, e muitos fizeram pouco caso. Mas, depois de um tempo, e tendo tentado de tudo para que os “espíritos malignos” fossem embora, tudo piorou. Rosa conta que esses “demônios” possuíram sua filha e seus netos, que se tornaram assustadores.
Foi em abril de 2012 que Latoya decidiu conversar com o médico da família, Geoffrey Onyeukwu, que ficou bastante assustado com as declarações dadas pela mulher. Até então, em seus relatórios, Onyeukwu afirmava se tratar de episódios de alucinação por parte da mãe, mas médicos de sua equipe afirmaram ter visto o filho mais novo de Latoya ser levantado e arremessado à parede sem que ninguém tocasse nele. Neste dia, a polícia foi chamada.
Todos passaram a suspeitar de negligência de Latoya contra suas crianças, e que eles estavam apenas performando para ela, por alguma doença mental que ela talvez estivesse apresentando. Ainda assim, outros episódios assustadores aconteceram diante de outras pessoas. Em um deles, disseram que um dos filhos de Ammons subiu de costas pelas paredes. Tudo o que aconteceu no hospital e com o dr. Onyeukwu está registrado no relatório da Divisão de Apoio à Criança da cidade de Washington.
Exorcismos foram realizados na criança de 9 anos — a que, aparentemente, subiu pelas paredes. Após os acontecimentos no hospital, em 20 de abril de 2012, o capelão do hospital entrou em contato com o padre Michael Maginot, da igreja St. Stephen Martyr Parish, em Merrillville. Alega-se que três exorcismos foram realizados na criança. A casa também foi vistoriada por Maginot, junto de três policiais, que perceberam falhas em seus equipamentos eletrônicos.
Apesar de ter perdido a custódia dos seus filhos quando a situação ficou realmente feia em abril de 2012, Latoya reconquistou seus direitos de mãe em novembro do mesmo ano, quando se mudou da “casa assombrada”. Seus filhos e ela passaram a fazer terapia em conjunto e, até onde se sabe, nenhuma outra ocorrência aconteceu após os horrores enfrentados no começo daquele ano.
A história de Latoya Ammons foi coberta em 2014 pelo jornal IndyStar e logo ganhou reconhecimento. A reportagem ainda está disponível no site do jornal para ser conferida.
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A experiência de Lee Daniels
Lee Daniels, diretor de A Libertação, já emplacou alguns sucessos no cinema, como Obsessão (2012), O Mordomo da Casa Branca (2013) e Preciosa: Uma História de Esperança (2009), obra que recebeu seis indicações ao Oscar em 2010, nas categorias de Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Edição, Melhor Atriz (Gabourey Sidibe), Melhor Atriz Coadjuvante (Mo’Nique) e Melhor Roteiro Adaptado, tendo vencido as duas últimas.
Primeiro filme de terror do cineasta, Daniels já pensava em trabalhar com o gênero há algum tempo, como contou em entrevista ao IndieWire: “Eu estava muito intrigado com essa história, e eu estava intrigado com a ideia de fazer horror porque eu sou obcecado por O Exorcista, por O Bebê de Rosemary e A Profecia”.
A primeira vez que ouviu falar da história de Latoya Ammons foi quando o caso ganhou notoriedade, no começo da década de 2010, mas a história ficou guardada até recentemente. Apesar de ter chegado a pensar sobre o projeto anteriormente, Daniels resolveu adiar sua realização porque sua mãe não ficou feliz com a ideia. Ele conta que “Eu desisti no último minuto porque minha mãe enlouqueceu. Nós acreditamos nesses espíritos, os bons e os ruins, e ela sentiu que eles poderiam vir atrás de mim. Parece brega, mas ela me convenceu”.
Devido às suas crenças religiosas, ao tema do filme, que trata de abuso e horrores reais vividos por uma família, e ao fato de ter acabado de trabalhar com algo semelhante em Preciosa, Daniels decidiu se afastar do projeto por um tempo.
Algo mudou nos últimos anos para Daniels, o que o levou a retomar o projeto. Após a eleição de Donald Trump, ele sentiu uma atmosfera sombria, como se o mundo que conhecemos pudesse não durar muito. Para ele, A Libertação não é apenas sobre sustos, mas uma jornada espiritual. E, também, se trata de lidar com o tema junto à comunidade negra. “Eu não sabia se tínhamos visto esse tipo de fundamentação em um mundo negro na tela”, afirma Daniels.
Filme x História real
No filme, vemos Ebony como uma mulher sem crenças e bastante dura diante da vida. Sempre fora de casa, com problemas com dinheiro, Ebony realmente parece negligente. A relação com sua mãe não é das melhores, e seus filhos não confiam nela. No material original, até onde sabemos, não temos tantas informações sobre o passado de Latoya ou sua relação com os filhos.
A idade de algumas das crianças também foram alteradas — na história real, as crianças têm 7, 9 e 12 anos. Outra alteração foi a etnia de Rosa, que no filme se chama Alberta. Daniels afirmou em entrevistas que decidiu fazer com que a mãe da protagonista fosse branca para dar outras camadas à história, pois conhece muitos amigos que têm essa relação em casa.
E uma última alteração significativa é o próprio ritual usado para livrar as crianças e a casa dessa “presença demoníaca”. No caso de Ammons, um ritual de exorcismo da igreja católica foi realizado. Já no filme, um ritual chamado “libertação” — como no título, em inglês deliverance —, da igreja evangélica, foi utilizado.
Assim como muitas histórias dentro do horror religioso, A Libertação é um filme profundamente enraizado na crença e na disputa entre bem e mal. Apesar de não negar que há algo estranho ocorrendo na casa, Daniels conduz a história como se a atitude errática de Ebony (ou Latoya) fosse a responsável pelo mal ter, talvez, se apossado da família, quando não temos, através das reportagens mais facilmente acessíveis, essa informação. Para alguns fãs, pode ser um assunto delicado.
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