Investigações e assassinatos no interior norte-americano: retrospectiva True Detective

A série de Nic Pizzolatto fez sucesso em sua primeira temporada. Desde então, tem tentado reaver sua audiência e seu tom sombrio. Com uma nova temporada prestes a estrear, preparamos uma retrospectiva de True Detective.

Algumas séries são capazes de criar um verdadeiro culto ao redor delas. True Detective, em seu lançamento, foi uma delas. Apesar de ter uma história focada em investigação, o mistério e os elementos de terror que encheram a tela em sua primeira temporada foram um atrativo para que ela se transformasse nesse fenômeno. O clima árido; os conflitos internos e externos entre os dois responsáveis pela investigação; o caso, por si só, que era estranhíssimo; houve uma união de características que tornam a primeira temporada de True Detective um prato cheio para os fãs do gênero.

Apesar da segunda temporada ter se distanciado um pouco do clima da primeira, a terceira trouxe novamente o tom sombrio do início da série, que tanto fez sucesso com o público de terror. Agora, com a quarta temporada prestes a estrear, as expectativas estão altas novamente. Com nomes como Barry Jenkins e Issa López atrelados à Terra Noturna, estamos curiosos para conferir o que True Detective nos reserva.

Para refrescar a memória dos fãs, a Macabra trouxe uma retrospectiva da série até o momento, desde seu lançamento em 2014. 

Primeira temporada

A temporada que lançou True Detective ao estrelato e se tornou um fenômeno foi a primeira, lançada em janeiro de 2014. O que foi escrito para ser somente uma continuação do livro de Nic Pizzolatto, Galveston, acabou se transformando em algo muito, muito maior quando o showrunner decidiu que aquela história não merecia somente um livro, mas sim um seriado inteiro. 

Com uma narrativa não linear, acompanhamos dois agentes de investigação da polícia da Louisiana,  Rustin “Rust” Cohle (McConaughey) e Martin “Marty” Hart (Harrelson). Em 1995, um dos tempos em que a série se passa, a dupla investigava o assassinato da prostituta Dora Lange. Depois de dezessete anos — em 2012, o outro momento da série que acompanhamos —, ambos precisam se encontrar e rever o caso.

Nesse meio-tempo, entretanto, muita coisa mudou. Rusty, que já era um homem ensimesmado, tenta lidar com seu passado conturbado; Marty, por outro lado, enfrenta as consequências de sua vida de infidelidades contra sua esposa, sempre em conflito com sua própria visão de mundo. Ambos acabam se magoando muito no processo, e o que era uma relação difícil se torna praticamente impossível. Mas o caso precisa ser levado adiante.

Ao longo da temporada os temas recorrentes são pessimismo, masculinidade e a religião — este último, tema importante para a trama, que é considerada uma das melhores representantes do Southern Gothic dos últimos anos. Mas, uma das coisas que mais chamou a atenção dos fãs de horror para esses oito episódios são os claros acenos à ficção weird e a um livro em particular: O Rei de Amarelo, de Robert W. Chambers. Vários elementos presentes na obra de Chambers — que, por sua vez, também estiveram presentes nas obras de Ambrose Bierce e até mesmo nos escritos de H.P. Lovecraft — também são encontrados na primeira temporada de True Detective, como Hastur, ou o Rei de Amarelo, e a cidade de Carcosa.

McConaughey e Harrelson também são dois dos pontos altos da primeira temporada. Enquanto Marty é um sujeito bastante comum no que podemos esperar de um homem branco, dos anos 1990, em pleno sudeste dos Estados Unidos, Cohle tem suas perturbações filosóficas e algo que parece puni-lo todos os dias. A dinâmica dos dois foi responsável por grande parte do sucesso da trama. Inicialmente a ideia era que McConaughey interpretasse Marty Hart, mas o ator estava convicto de querer o papel de Rusty, e deu a ideia para Pizzolatto chamar seu amigo de longa data, Harrelson, para o papel de Marty.

O que eu amo no Cohle é que tudo o que ele diz é verdade. Goste ou não. (…) Sem ilusões. — Matthew McConaughey

A primeira temporada de True Detective teve, majoritariamente, críticas positivas; além disso, recebeu diversos prêmios durantes as temporadas de premiação de 2014 e 2015, como o Emmy de Melhor Direção em Série de Drama para  Cary Joji Fukunaga, que dirigiu todos os episódios dessa temporada; e o prêmio de Melhor Ator em Série de Drama para Matthew McConaughey, no Critics’ Choice.

Segunda temporada

Depois de conseguir chamar tanta atenção com True Detective, Pizzolatto fechou outro acordo com a HBO para mais duas temporadas da série. Entretanto, a decisão foi seguir o caminho da antologia. Cada temporada contaria uma história diferente, com atores diferentes e trabalhando com temas variados. 

Na segunda temporada, que foi ao ar em junho de 2015, a Louisiana dá lugar à Califórnia. Depois de encontrar o corpo de um administrador municipal corrupto, o policial rodoviário e veterano Paul Woodrugh (Taylor Kitsch) conta com a ajuda de um detetive do Departamento de Polícia, Raymond “Ray” Velcoro (Colin Farrell), e da sargento da Divisão de Investigação Criminal do Gabinete do Xerife, Antigone “Ani” Bezzerides (Rachel McAdams).

Ao mesmo tempo, um criminoso da cidade, Francis “Frank” Semyon (Vince Vaughn), que tinha negócios inacabados e perdeu uma boa quantia em dinheiro com a morte do administrador municipal, começa sua própria investigação para encontrar o culpado.

No início do processo de criação da segunda temporada, Pizzolatto havia afirmado que a história seria sobre “homens maus, mulheres duronas e a história secreta e oculta do sistema de transporte dos EUA”. Mas isso mudou com o tempo, e o showrunner contou que gostaria de manter o foco nos personagens e em uma história de crime mais fundamentada.

Ou seja, a segunda temporada de True Detective focou muito mais no “detective” da questão, e abandonou uma das coisas que mais fizeram com que a primeira temporada fosse um sucesso: os temas que orbitavam a vida de personagens carismáticos e sua profundidade. Os questionamentos de Cohle, aliados ao temperamento terrível de Marty, era uma dinâmica que funcionava e atraía. Além disso, se passando no Cinturão da Bíblia — uma demarcação regional dos Estados Unidos sulista toma boa parte do Sudeste do país —, trazia discussões interessantes ao seriado. A ficção weird dá espaço às investigações mais focadas na realidade, o que deixa a trama um pouco mais genérica.

A direção da série, também, perdeu um pouco ao desconcentrar a direção única que Cary Joji Fukunaga havia entregado na primeira temporada, com episódios sendo dirigidos por seis diretores diferentes — Justin Lin (dois episódios), Janus Metz, Jeremy Podeswa, John Crowley (dois episódios), Miguel Sapochnik e Daniel Attias. 

Apesar de ter mantido uma boa taxa de audiência, a segunda temporada de True Detective recebeu críticas divididas. Seu desenvolvimento foi satisfatório, mas não tinha aquele quê a mais que os fãs esperavam receber. Foi indicada a alguns prêmios, mas não levou nenhum dos maiores — Emmy, Critics’ Choice — para casa.

Terceira temporada

Talvez tendo percebido que era o teor macabro e o horror que mais chamavam a atenção do público em sua série, Pizzolatto retomou suas origens (mesmo que de forma mais leve) na terceira temporada de True Detective, que estreou em janeiro de 2019.

Dessa vez, Wayne Hays (Mahershala Ali) e seu parceiro, Roland West (Stephen Dorff), precisam investigar o caso de suas crianças desaparecidas na região das Ozark. Também como na primeira temporada, temos temporalidades diferentes para contar a história, que se passa ao longo de três décadas — nos anos de 1980, 1990 e 2015 —, e nem sempre seguimos uma ordem linear na cronologia.

Nos encontramos novamente com uma história que guarda algumas semelhanças com a primeira temporada. Não, talvez, sendo possível fazer uma comparação com os elementos de horror que a primeira temporada traz, ou com os debates filosóficos intensos do personagem de McConaughey, mas o desenvolvimento de Hays e seu relacionamento com o caso nos lembram os primórdios da série.

A direção dos episódios, também, é concentrada na mão de apenas três cineastas: Jeremy Saulnier (dois episódios), Nic Pizzolatto (dois episódios) e Daniel Sackheim (quatro episódios), o que talvez possa dar mais coesão à temporada como um todo. 

Mas, além disso, a escolha de Mahershala Ali como protagonista foi o passo necessário para que a série se destacasse novamente. Inicialmente pensado como um personagem branco, para Ali havia sido oferecido um papel de coadjuvante. Mas, ao enviar fotos de seu avô, um policial estadual, fardado, Ali acabou demonstrando a Pizzolatto que poderia dar mais profundidade ao papel de protagonista. “As fotos ajudaram a mostrar a ele o quanto era pessoal para mim”, afirmou o ator em entrevista ao site EW.

Apesar de ter perdido um pouco a audiência em comparação com as duas primeiras temporadas, a terceira temporada apresentou críticas melhores que a segunda. 

Quarta temporada

Não foi exatamente uma surpresa quando a quarta temporada de True Detective foi anunciada. Antes mesmo da estreia da terceira temporada, Pizzolatto já havia anunciado ter uma ideia interessante sobre uma nova temporada, com uma nova história. 

A surpresa, em si, foram os nomes atrelados ao projeto. Barry Jenkins foi contratado como produtor executivo, e Issa López foi chamada para escrever alguns roteiros, dirigir o episódio piloto e ser produtora executiva ao lado de Jenkins e Adele Romanski e Mark Ceryak. Pizzolatto permanece como produtor executivo, mas, pela primeira vez nos últimos dez anos, não tem os créditos como roteirista. 

Onde True Detective é masculino e é suado, Terra Noturna é gelado, e é escuro e é feminino

É a primeira vez, também, que temos um subtítulo para uma temporada, o que mostra, talvez, uma nova abordagem para o futuro da série. López, em entrevista, afirmou que “Onde True Detective é masculino e é suado, Terra Noturna é gelado, e é escuro e é feminino”. López ficou conhecida no meio do terror por seu excelente longa Os Tigres Não Tem Medo, de 2017. O filme mexicano foi aclamado pela crítica internacional, sendo constantemente comentado por Guillermo del Toro. Desde então, os olhos dos fãs do gênero têm se voltado à produção da cineasta e aguardado com curiosidade seus próximos projetos. 

Jenkins, também, não é nenhum novato. Sua experiência, entretanto, é voltada aos dramas, que receberam muita atenção nas temporadas de premiações como Moonligh: Sob a Luz do Luar (2016) e Se a Rua Beale Falasse (2018).

A nova temporada nos apresenta uma investigação do desaparecimento de oito homens de uma estação de pesquisa no Alasca. As protagonistas serão as investigadoras Liz Danvers e Evangeline Navarro, interpretadas por Jodie Foster e Kali Reis. Outros nomes confirmados no elenco são John Hawkes, Christopher Eccleston, Fiona Shaw, Finn Bennett e Anna Lambe. 

Confira o trailer da produção, que estreia no dia 14 de fevereiro no canal da HBO e no serviço de streaming, HBO Max.

*

E você, está ansioso para a estreia da quarta temporada de True Detective? Qual a sua favorita? Comente com a Macabra no Twitter e Instagram.

Compartilhe:
pin it
Publicado por

Acordo cedo todos os dias para passar o café e regar minhas plantas na fazenda. Aprecio o lado obscuro da arte e renovo meus pactos diariamente ao assistir filmes de terror. MACABRA™ - FEAR IS NATURAL.