Um olhar sobre James Wan, o criador de Invocação do Mal

Diretor, roteirista e produtor, James Wan tem uma sólida carreira no cinema de gênero e se consolida ano após ano como um dos maiores produtores de terror da atualidade.

* Texto traduzido e adaptado do Bloody Disgusting.

Ao olhar para a produção de terror dos últimos 20 anos, um nome se destaca por conta de seu constante trabalho no cinema de gênero. Ganhador de 14 prêmios (e indicado a outros tantos), James Wan é escritor, diretor, produtor e editor que dedica sua carreira a cultivar grandes histórias no campo audiovisual.

No ano em que James Wan nasceu, Wes Craven apresentava ao mundo Quadrilha de Sádicos, e David Cronenberg estreava Enraivecida na Fúria do Sexo para uma curiosa plateia. Os filmes de horror já estavam angariando fãs em 1977, e o garotinho que chegava ao mundo nem imaginava o que estava por vir.

James Wan em set de filmagem

Em 2016, William Bibbiani (roteirista da Blumhouse), escreveu um artigo para celebrar os mestres contemporâneos do horror, e colocou James Wan entre os grandes nomes que fazem a diferença no cenário: Guillermo del Toro, Chan-Wook Park, Lucky McKee e Adam Wingard. Entre filmes excelentes e muito esquisitos, é fato que todos se dedicam muito, mas Wan é, de longe, o mais impressionante e prolífico nome do terror contemporâneo para os últimos 20 anos.

Bibbiani postula que, para ser considerado um mestre do terror, o nome deve atender a todos os seguintes critérios: a) ter dirigido pelo menos um filme de terror verdadeiramente brilhante; b) ter dirigido vários filmes no gênero de terror (ou pelo menos gêneros intimamente relacionados ao terror, como thrillers psicológicos); c) ter atingido proeminência dentro do gênero nos últimos 20 anos e d) ter dirigido consistentemente filmes de terror bons, grandes ou, no mínimo, diferenciados. Vamos começar de cima, certo?

O que faz um mestre do horror

James Wan e sua primeira grande criação

a) um filme de terror brilhante

Até a data do artigo de Bibbiani, Wan havia dirigido oito longas-metragens, seis dos quais foram filmes de terror. Sua estreia na direção foi em um filme de horror de baixo orçamento, Stygian, sobre um casal que fica preso em outro mundo. Esse filme é raríssimo, quase parece que não existe, então falar dele é complicado, mas ele está lá.

Já do primeiro longa-metragem podemos falar bastante. Aos 27 anos de idade ele lançou nada mais, nada menos que Jogos Mortais (2004). É claro que com o andamento da franquia, Jogos Mortais passou a ser considerado um tipo de sinônimo de torture porn, mas o primeiro filme (o único que ele dirigiu) certamente pode — e deve — ser considerado brilhante. A obra conta com um final inusitado e angariou US$ 55 milhões, contra o orçamento de US$ 1 milhão para a produção. Essa foi a mola propulsora que levou Wan — e seu excelente parceiro de roteiro, Leigh Whannell — ao estrelato imediato.

James Wan e Cary Elwes no set de Jogos Mortais

b) vários filmes de terror

Após o sucesso de Jogos Mortais, Wan optou por não dirigir a sequência direta (ou qualquer uma delas) e, em vez disso, voltou sua atenção para Gritos Mortais, de 2007, também co-escrito com Whannell. Embora esteja longe de ser um filme terrível, o projeto foi o resultado de criatividade forçada devido a um acordo intermediado por Wan e Whannel com seus agentes, para o caso de Jogos Mortais ser um fracasso. Eles prometeram um segundo filme, mas não tinham ideias para compor um roteiro, então Whannell se trancou em seu apartamento e produziu o que precisava. Seus corações claramente não estão no filme (e esse é o problema, ainda que seja notável que eles conseguiram o máximo que aquelas bonecas assustadoras ventríloquas podiam dar).

O ano de 2007 também viu o lançamento de Sentença de Morte, o thriller de vingança de Kevin Bacon que seria a primeira incursão de Wan a um gênero fora do terror. Baseado no romance de Brian Garfield, o filme foi um fracasso crítico e comercial. Isso levou Wan a fazer uma pausa por alguns anos antes de voltar às suas raízes de horror com Sobrenatural, em 2010. O filme chegou quando o mundo sabia que Wan não era um cavalo de um único truque — o diretor sabia que Jogos Mortais era o que as pessoas o conheciam, mas ele não queria que seu nome fosse sinônimo de sangue, sangue e mais sangue simplesmente. Dessa forma, Sobrenatural nasceu limpinho. Sustos reais, ao invés das vísceras expostas, aterrorizaram o público — e James Wan conseguiu de novo.

Em 2013, Wan invadiu os cinemas com Invocação do Mal (em julho) e Sobrenatural: Capítulo 2 (em setembro). Como muitas pessoas já sabem, Invocação do Mal é um filme quase perfeito que não necessariamente reinventa a roda do terror, mas a gira perfeitamente bem. É o filme mais bem avaliado de Wan, o que o tornou finalmente um talento indiscutível.

Sobrenatural: Capítulo 2, por outro lado, foi um pequeno passo em falso para o diretor. Embora não seja tão atroz quanto as críticas pregam, a sequência é bem mais… boba que o primeiro filme, atribuindo uma história de fundo sem brilho ao vilão secundário do primeiro. Se você ainda não viu, é uma boa ideia emendá-lo com o primeiro — é melhor ver esses dois filmes como um só.

Logo depois, Wan deixou o gênero novamente para filmar uma das sequências de Velozes e Furiosos. Foi aqui que ele teve que lidar com a trágica morte de Paul Walker, enquanto se concentrava e dedicava a fazer um bom filme. O público pareceu achar que ele fez um ótimo trabalho, já que essa sequência rendeu US$ 353 milhões no mercado interno, mais do que qualquer filme da franquia. É triste dizer que a morte de Walker, sem dúvida, teve um grande impacto nas bilheterias, mas a bilheteria também provou que James Wan era capaz de entregar um filme sólido fora do terror.

James Wan e um amigo encapetado no set de Invocação do Mal

c) proeminência nos últimos 20 anos

Isso nos leva a 2016, quando Wan fez uma volta estrondosa ao universo de Invocação do Mal 2. Seria compreensível supor que Wan falhasse com a sequência (como Sobrenatural: Capítulo 2), mas se você viu o filme, sabe muito bem que esse não foi o caso. A continuação mantém o clima sombrio da agora franquia, e arrepia os espectadores mais céticos.

Pedimos desculpas pela longa lição de história, mas é importante compreender tudo o que Wan alcançou durante seus primeiros 12 anos na indústria cinematográfica, a fim de entender sua importância para o gênero de terror, algo que Bibbiani também fez questão de notar. E olha que nem falamos dos filmes em que ele atua como produtor (todas as sequências de Jogos Mortais, Annabelle, Demonic, e segue a lista).

O que torna Wan tão importante é que ele está colocando horror nos olhos do público sem comprometer sua própria visão; ele é íntegro. Na maioria das vezes, você vê estúdios brincando com filmes de terror até que a visão original esteja irreconhecível (basta olhar para The Thing, de 2011, ou Alien 3, de Fincher). James Wan deu todas a provas de que sabe o que está fazendo, e os estúdios confiam no seu taco. Com exceção de Gritos Mortais, ele sempre tem controle total do filme em que está trabalhando. Seu estilo de direção é tão específico que você seria capaz de dizer que está assistindo a um filme dirigido por Wan, mesmo se você não o conhecesse.

Embora muito desse domínio seja devido aos scripts com os quais Wan teve que trabalhar (alguns dos quais ele co-escreveu), não deixa de ser uma prova de suas habilidades como diretor, e de como ele é capaz de entregar personagens com os quais o público realmente se importa. Quer se trate de Ed e Lorraine Warren, ou da família Lambert, Wan criou personagens passíveis de empatia, uma característica que muitas vezes é esquecida ou deixada de lado em filmes de terror.

Set de Invocação do Mal com James Wan e o casal de protagonistas

d) consistência na qualidade

Embora o sucesso de bilheteria não seja (ou não deveria ser) um fator que determina o que é um mestre do horror, é importante observar que os filmes de Wan são verdadeiros blockbusters e assistidos por muita gente. A produção independente de horror é uma contribuição maravilhosa para o gênero, mas na maioria das vezes esses filmes não são muito rastreáveis. É importante para um mestre do horror ter seus filmes vistos por um público amplo, a fim de manter o gênero nos olhos — e coração — dos espectadores, e deixá-los desejando mais, muito mais.

Mas a chave para o sucesso de Wan é outra. É algo que floresce da combinação consistência & frequência. Wan não para de produzir filmes, e o fato de que a maioria deles é bom é uma prova de seu talento como diretor. Todos os mestres mencionados por Bibbiani tiveram alguns problemas com consistência. Del Toro havia caído recentemente com o Pacific Rim e The Strain, e só se recuperaria com o lançamento e o sucesso estrondoso de A Forma da Água, dois anos mais tarde. Com exceção de The Woman, McKee também não havia feito nenhum filme decente desde 2002.

E acima de tudo: Wan é legal. Sério, você já viu esse cara em uma entrevista? Em dois minutos fica claro que ele tem uma paixão insana — macabra — por seu trabalho. Ele fica tão animado quando fala sobre seus filmes que é impossível não nos empolgarmos com o sucesso que ele conquistou.

Ainda que não tenha sido um sucesso de crítica, James Wan fez algo legal no filme de origem do Aquaman para a DC Comics, mas também esteve envolvido em Annabelle 2 e A Freira. E em 2019 produz A Maldição da Chorona e Annabelle 3: De Volta para Casa, só para começar. O horror vive — e lucra — nas mãos dele.

Só nos resta desejar sorte e liberdade de criação para ele, porque talento e carisma esse cara tem de sobra.

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