Por que alguns vírus simplesmente desaparecem?

A humanidade já escapou de outras pandemias por pura sorte.

É meio surreal pensar que seres tão pequenos, microscópicos para sermos exatos, e com uma estrutura de vida tão simples possam parar o mundo, impedir viagens, trancar pessoas em casas, colapsar sistemas de saúde e economias de maneira tão súbita. Hoje a humanidade vive esta dura realidade com a Sars-CoV-2, uma espécie de coronavírus que causa a covid-19.

Apesar de ser o vírus que está despendendo a maioria dos esforços de combate no momento, há muitos outros vírus e outros microrganismos que são tão letais e chegaram muito perto de causar estragos semelhantes. Eles são os protagonistas do livro Medicina Macabra 3, de Barry e David Zimmerman, que explicam como estes assassinos invisíveis foram capazes de alterar os rumos da humanidade.

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Uma situação de pandemia como a da covid-19 é algo inédito para a humanidade. A última vez que seres humanos foram afetados com tanta brutalidade ocorreu há cerca de um século e sem as facilidades (e contratempos) do mundo globalizado. Mas este cenário caótico quase ocorreu em anos recentes e entender os motivos para que outras pandemias não vingassem pode ser ainda mais assustador.

Sars 2003: Mais sorte do que juízo

A estas alturas já estamos acostumados com o processo e as nomenclaturas de uma pandemia: o contato com animais selvagens infectados, a fusão entre diferentes espécies, o paciente zero e a disseminação ao redor do mundo. Mas o que separa algumas doenças transmissíveis de se tornarem uma epidemia passageira de uma pandemia como a de covid-19? Até os cientistas ficam intrigados com esta pergunta.

Um caso recente de um vírus que por pouco não causou uma pandemia foi o da Sars em 2003. O mundo ouviu falar pela primeira vez dela em fevereiro daquele ano, quando o escritório de Pequim da Organização Mundial da Saúde (OMS) recebeu um alerta sobre uma doença estranha que havia matado 100 pessoas em uma semana.

De forma muito semelhante à Sars-CoV-2, o primeiro foco parece ter ocorrido em um local que tinha feiras de animais exóticos e frescos (em alguns casos ainda vivos). Apesar de um começo muito parecido com a pandemia atual, dois anos após este alerta a Sars havia infectado 8.096 pessoas e causado a morte de 774. 

As semelhanças iam além da origem da doença: tratava-se de um vírus de RNA e que era propagado por partículas na fala e na respiração, algo difícil de evitar. Na época acreditava-se que o estrago poderia ser semelhante ao da pandemia de gripe de 1918, que infectou um terço da população mundial e matou cerca de 50 milhões de pessoas. Afinal, o que separa a Sars da pandemia que vivemos hoje?

De forma resumida, tivemos sorte. O vírus se conduziu à extinção por uma combinação de fatores, desde seu comportamento no corpo humano, passando pela resposta das autoridades à época e culminando com evoluções genéticas que nos beneficiaram.

Vamos aos detalhes: pacientes infectados com Sars ficavam muito doentes. A taxa de mortalidade do vírus era de quase 20%. Ao mesmo tempo, era relativamente fácil identificar quem estava infectado e tomar as medidas de isolamento. Diferentemente da covid-19, não existiam pessoas sem sintomas para silenciosamente espalharem o vírus. Além disso, o período entre incubação e transmissão era mais longo, dando mais tempo para o rastreamento e antecipar a quarentena de pessoas possivelmente infectadas.

As autoridades também agiram mais rapidamente no rastreamento da doença. Acredita-se que um único paciente possa ser associado a metade dos casos de Sars, incluindo contato com pessoas de outros países. A cooperação internacional foi crucial para mitigar a disseminação em outras localidades.

Outro fator que contribuiu foi sorte mesmo: os humanos conseguiram controlar a epidemia e o vírus da Sars não tem outro hospedeiro óbvio. Acredita-se que ele tenha sido contraído a partir de um animal chamado musang, um mamífero considerado um prato fino na China. Porém até neste animal a infecção pelo vírus é rara, e seu consumo por humanos muito mais restrito.

O desafio constante de erradicar vírus

Infelizmente o episódio da Sars é bem raro. Apenas outros dois vírus foram extintos de propósito: varíola e peste bovina. E nem estes outros casos foram fáceis de combater, uma vez que é particularmente difícil erradicar estes organismos quando eles se adaptam com consistência aos seus hospedeiros.

A guerra contra tais vírus foi vencida com o uso de vacinas, que também chegaram muito perto de erradicar outras doenças, como pólio e sarampo. Infelizmente os avanços enfrentam resistência como a dos movimentos antivacina.

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Além disso, há outros tipos de vírus causadores de doenças que a humanidade não consegue erradicar, principalmente porque os humanos não são os únicos hospedeiros. Um exemplo é o vírus Ebola, que teve pelo menos 26 surtos na África desde 1976.

Por ser altamente letal, os agentes de saúde agem rápido para conter estes surtos e evitar que a doença se torne uma pandemia. Porém, mesmo com este controle o vírus retorna de tempos em tempos, pois ele migra de outros animais – principalmente morcegos — para os humanos. Além disso, há a própria evolução do Ebola em novas cepas.

Outra doença que esteve nas manchetes mundiais foi a Mers, que infectou humanos a partir de camelos. Apesar de estar fora do radar desde 2012, acredita-se que ela tenha ressurgido em centenas de surtos desde então.

O perigo dos vírus de RNA

Enquanto alguns vírus praticamente desaparecem e outros surgem de tempos em tempos, existem aqueles que convivem há décadas ou séculos inteiros com o ser humano. Influenza, HIV, coronavírus e Ebola são alguns que se enquadram na categoria dos vírus de RNA, ou seja, eles “sequestram” o organismo de seus hospedeiros para se reproduzir.

Isso geralmente não é nada bom para os humanos, pois estas mutações resultam em uma diversidade muito grande para o vírus. Isso faz com que ele evolua rapidamente, tornando as vacinas e remédios obsoletos rapidamente. É por isso que a vacina da gripe deve ser reforçada todos os anos.

No curto prazo isso torna o combate às doenças causadas por estes vírus ainda mais complicado, pois permite a infecção por cepas que o nosso organismo ainda não conhece e que podem “burlar” a segurança dos anticorpos.

Porém, essa mutação desenfreada é uma faca de dois gumes. Acima de determinada taxa, estas mutações podem se tornar perigosas para os próprios vírus. Isso causa uma sobrecarga de falhas genéticas que pode conter a disseminação e, eventualmente, extinguir o próprio vírus. Estas mutações podem ser estimuladas em laboratório, direcionando que tais evoluções tornem os vírus mais fracos ou menos nocivos para seres humanos. 

De qualquer forma, é muito difícil afirmar que algum vírus esteja realmente extinto, até mesmo estes que desapareceram “do nada”. Eles podem se esconder na vida selvagem e ressurgir de tempos em tempos. Porém, isso não significa que os esforços humanos para erradicá-los sejam inúteis. A própria pandemia de covid-19 pode significar um salto na nossa relação com estes patógenos e, quem sabe, algum dia nos preocupemos menos com o coronavírus do que com a varíola.

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Renunciei à vida mundana para me dedicar às artes da trevas. No meu cálice nunca falta vinho ungido e protejo minha casa com gatos que afastam os espíritos traiçoeiros. MACABRA™ - FEAR IS NATURAL.