In Search of Darkness: a evidência da criatividade dos anos 1980

Em entrevista para a Macabra, David A. Weiner, diretor de In Search of Darkness, fala sobre criatividade, produção e cenários políticos no horror

In Search of Darkness é um documentário de 2019 que explora o desenvolvimento e o impacto duradouro do gênero de filmes de terror durante os anos 1980. Apresentando críticas críticas convincentes, histórias privilegiadas e anedotas inéditas, este documentário extraordinário oferece uma nova perspectiva da década que deu origem a alguns dos melhores filmes e franquias do gênero terror.

O diretor, David A. Weiner, apresenta um elenco incrível de mais de 45 colaboradores, incluindo John Carpenter (O Enigma de Outro Mundo), Heather Langenkamp (A Hora do Pesadelo), Doug Bradley (Hellraiser), Kane Hodder (Sexta-feira 13) e Barbara Crampton (Re-animator). Essas lendas de terror dos anos 80 se juntam a críticos e comentaristas de terror populares, incluindo James Rolfe (Cinemassacre), James A. Janisse (Dead Meat) e Joe Bob Briggs (anfitrião do The Last Drive-In with Joe Bob Briggs).

In Search of Darkness tem duração de 4h20 e será exibido na íntegra no Phenomena Festival nos dias 01 de dezembro (às 17h no SPCine Olido) e 12 de dezembro (às 17h no Centro Cultural São Paulo). Cada um dos colaboradores deste documentário de horror dá uma visão única do gênero e dos filmes dos quais fizeram parte. Esta é a oportunidade que espectadores brasileiros têm de conhecer os bastidores de seus filmes de terror favoritos com o maior elenco de lendas de terror dos anos 1980 já montado.

Em parceria com o festival, trouxemos uma entrevista com o diretor do documentário, David A. Weiner, também editor e jornalista.

ENTREVISTA COM DAVID A. WEINER

  • Olá David, primeiramente desejamos boas-vindas ao nosso país. Em segundo lugar, queremos agradecer pela oportunidade que você nos deu, de revisitar o incrível material que forjou o horror como conhecemos hoje. De onde surgiu a ideia de reunir todos esses monstros do panteão sagrado do horror em um único documentário? Qual foi a principal dificuldade desse projeto?

O aspecto mais difícil de fazer In Search of Darkness foi limitar tanto o conteúdo para caber na narrativa. Cobrir toda uma década de gênero de cinema de uma forma compreensível tem um dilema único: quanto mais você inclui, menos tempo você tem para explorar cada tópico. E mesmo com um doc de mais de quatro horas, é impressionante como o tempo passa mesmo com a densidade do material.

Fazer um filme com esse escopo sempre vai render uma frustração que algum filme querido de terror não receba tanto amor. Mas o prazer em fazer esse documentário era conseguir fazer tantos ícones incríveis e talentosos do terror sentarem e compartilharem não só suas histórias pessoais de produção, mas seu amor pelo cinema, pelo gênero e outras informações.

  • No Brasil, crescemos com os olhos vidrados nas produções de John Carpenter, Tobe Hooper, George Romero, Wes Craven e David Cronemberg, e com nossos quartos decorados com os rostos de Cassandra Peterson, Bill Moseley e Doug Bradley. Enquanto sobrevivíamos aos duros anos da adolescência, nos distraímos e projetávamos nossa energia catastrófica em bastiões sagrados como Freddy Krueger, Michael Meyers e Jason Voorhees. Como foi estar cara a cara com algumas dessas personalidades? Pode nos contar um pouco de sua experiência pessoal durante o filme?

Como alguém consegue não ficar empolgado em sentar com pessoas como John Carpenter e Heather Langenkamp por uma hora para discutir seus trabalhos e filmes favoritos? Mesmo que eu tenha feito uma carreira profissional entrevistando várias personalidades da indústria de entretenimento, eu ainda sou um fã de cinema. Sinto uma emoção incrível em todo o processo de procurar um talento para uma entrevista, assistir filmes como “lição de casa”, preparar perguntas relevantes, discutir as histórias reais por trás dos meus momentos favoritos, e depois ir embora com a sensação de que eu conheci uma pessoa de verdade por trás da face famosa. Eu adoro conseguir traçar histórias relacionáveis e mostrar emoções de indivíduos experientes, e então conseguir encaixar isso no quebra cabeça de uma história maior. Não existe sensação melhor para mim.

  • Os anos 1980 estão em alta, e podemos ilustrar esse fato citando os fenômenos recentes Stranger Things e a série alemã Dark. Afinal de contas, o que existia nos oitenta de tão especial? O que se perdeu de lá pra cá, a ponto de não conseguirmos a mesma exuberância criativa daqueles anos?

Os anos 1980 representaram uma explosão real de talento e criatividade na frente e atrás das câmeras. E a maneira como consumimos filmes que acabariam se tornando parte do imaginário coletivo mudou – nós podíamos assistir esses filmes várias vezes em vídeo ou na TV a cabo ao ponto de conseguirmos citá-los do começo ao fim, rever nossas cenas favoritas, nossos efeitos especiais favoritos, nossas vitórias e derrotas favoritas. O material também era mais binário – bem vs. mal —, com personagens excêntricos, e estabelecendo tropos que nos manipularia e nos faria sorrir. É uma época que eu me conecto pessoalmente porque eu cresci nela.

O que foi perdido daquela época parece ser o volume de originalidade que vinha junto com a introdução desses filmes. Embora sempre haja narrativas derivadas e únicas na tela grande e pequena em qualquer década, os produtores que fazem filmes hoje em dia parecem mais interessados em criar histórias e personagens por comitê para garantir o retorno mais confiável de seus investimentos. Há muito pouco esforço para ir além da linha. Muito pouco esforço criativo ou evolução. O risco parece ser uma forma de arte moribunda hoje. Joe Bob Briggs diz em In Search of Darkness que, em comparação com muitos formadores de opinião hoje, os cineastas dos anos 80 estavam perguntando: “O que podemos fazer?” e não “O que podemos refazer?”. Eles tinham coragem naquela época, e sinto falta disso.

  • O horror é um gênero transgressor, e ultimamente, a cena política tem buscado se consolidar com a promessa de implantar uma nova onda de “decência e moralidade”, e na retomada de valores já tido como ultrapassado em muitos países (entre eles a censura, a doutrinação da arte de uma maneira geral). Você acredita que essa pressão possa vir a limitar a produção criativa dos próximos anos? Aumentando o nível de estresse dessa delicada questão, você acredita que o estado ou as organizações sociais tenham o direito de modular a arte?

Eu acredito muito que, não importa qual seja o cenário político, a arte encontra uma maneira de se expressar naturalmente. A ameaça de censura geralmente motiva os cineastas a serem ainda mais expressivos e criativos para transmitir sua mensagem, abertamente ou secretamente.

No entanto, acredito que uma certa quantidade de auto-regulação é importante para qualificar o conteúdo, pois as pessoas merecem estar cientes do que estão prestes a consumir, para que possam tomar suas próprias decisões informadas sobre se desejam ou não consumir algo. Se você não concorda com o conteúdo, não precisa se opor a ele. Simplesmente escolha não se envolver e consuma o que você preferir. Mas acredito que um discurso respeitoso e saudável é crucial para a educação, e a auto-regulação moderada, e não a censura, é a maneira de manter as mãos do governo fora da arte.

  • O Phenomena Festival tem como foco criar oportunidades de exibição e apreciação de filmes do mundo todo que flertam com o horror, o inusitado e o bizarro, incentivando a apreciação e a produção de filmes de gênero no Brasil. Quais suas expectativas para o festival? Sabemos que o documentário tem cerca de quatro horas e meia de duração, e também descobrimos que a avaliação em alguns canais especializados em cinema tem chegado a 100% de aprovação. A que você atribui esse sucesso, mesmo se tratando de uma produção considerada longa para os padrões habituais?

Os organizadores nos procuraram e gentilmente nos convidaram para fazer parte do festival. Estamos muito felizes por poder apresentar In Search of Darkness na frente de uma audiência ao vivo, pronta para compartilhar a sua nostalgia. Admiro a missão do Phenomena Festival de dar espaço ao cinema de grandes gêneros em suas diversas formas — o provocador e o não convencional. Eles têm um line-up maravilhoso este ano que reflete isso.

In Search of Darkness não é o formato de documentário cotidiano. Não é a norma. É um documentário gigantesco com duração de 4h20 e uma celebração da arte e paixão do trabalho de uma década, juntamente com sua influência e relevância reflexiva na época. Ele tenta contextualizar novamente a produção de uma era de três décadas. Quando o público entrar na vibe, as pessoas vão rir e aplaudir compartilhando a sua paixão coletiva por esses filmes. É a melhor experiência da comunidade de terror.

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Esta entrevista foi produzida pela Macabra em parceria com o Phenomena Festival. O evento acontece nas cidades de São Paulo e Paraty, entre 28 de novembro e 13 de dezembro, com doze dias de exibições, painéis e workshops. Confira a programação completa aqui e acesse o site do festival para saber mais.

Phenomena Festival 2019

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A beleza macabra do horror me conecta com o Outro Lado. Ofereço abrigo espiritual aos irmãos e irmãs da fazenda e acordo todos os dias às 3h da manhã. MACABRA™ - FEAR IS NATURAL.