Filme de terror também é arte. A inspiração pode surgir de diversos lugares, e grandes cenas do cinema foram criadas a partir de pinturas clássicas. A Macabra reuniu algumas dessas referências para o deleite de nossos leitores fascinados pelo horror.
O Pesadelo x Frankenstein
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O quadro O Pesadelo, de Henry Fuseli, é, talvez, um dos mais referenciados no terror — de forma direta ou indireta. Mas, com Frankenstein, essa ligação é ainda mais forte. Isso porque há uma conexão pessoal entre Fuseli e Mary Shelley. Ou melhor, entre Fuseli e Mary Wollstonecraft, a mãe de Mary Shelley: isso porque Wollstonecraft teve um romance com Fuseli antes de se tornar companheira de William Godwin. Acredita-se, inclusive, que o trabalho de Fuseli causou grande inspiração em Mary Shelley, principalmente em Frankenstein, com a descrição da personagem de Elizabeth Lavenza após a visita da Criatura.
O fato é que boa parte das adaptações da obra-prima de Shelley, desde então, de certa forma, utilizam o quadro de Fuseli como inspiração em algumas de suas cenas. Talvez o maior destaque, e a mais clara identificação, seja na primeira adaptação da obra, em 1910.
Não podemos deixar de citar, também, a adaptação de 1931, em que a personagem de Elizabeth está deitada em sua cama (esquerda), e também a referência bastante direta no filme Gothic (direita), cujo a história é levemente baseada na criação de Frankenstein, onde Mary, Percy, Lord Byron, Polidori e Claire se reuniram para suas férias, na Villa Diodati.
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O Império das Luzes x O Exorcista
Essa é uma referência bastante clássica. A imagem reproduzida à exaustão do filme O Exorcista, que inclusive se tornou um dos pôsteres mais icônicos do cinema, de quando o incansável padre Merrin chega à casa da família MacNeil, faz uma referência bastante direta ao quadro de René Magritte O Império das Luzes.
Há sentimentos de expectativa e ansiedade quando vemos ambas as imagens, como se nos questionássemos o que poderia acontecer a seguir.
Saturno Devorando um Filho x O Labirinto do Fauno
A mente de Guillermo del Toro é uma caixinha de surpresas, capaz de reunir diversas referências e utilizá-las a seu bel-prazer quando está trabalhando em uma de suas produções — das mais fantásticas às mais aterrorizantes. Para o Homem Pálido, de O Labirinto do Fauno, uma dessas referências foi o quadro de Francisco Goya, Saturno Devorando um Filho.
Del Toro já afirmou em entrevistas que, a cena em que a criatura aparece engolindo algumas fadas, é uma referência direta ao famoso quadro de Goya.
A Casa ao Largo da Ferrovia x Psicose
Impossível olhar a pintura A casa ao largo da ferrovia, de Edward Hopper, e não se lembrar de uma certa casa, em um certo hotel, que foi cenário de um crime chocante onde uma jovem foi assassinada no banheiro.
Referência bastante óbvia de Hitchcock que, com seu talento de saber utilizar muito bem suas referências, nos brindou com algumas das cenas mais icônicas do cinema — ele próprio vindo a ser referência de cineastas posteriores. Este é somente um dos quadros que o cineasta já utilizou em sua carreira, tendo sempre deixado uma ou outra influência sua bastante clara ao longo de suas produções.
Hypnosis x O Farol
Não é exagero dizer que O Farol, segundo trabalho na direção de longas de Robert Eggers, é uma obra de arte e que a maioria de suas cenas são compostas por um trabalho visual afiadíssimo. Além de ser um grande pesquisador e contador de histórias, Eggers é outro daqueles cineastas que conseguem explorar sua lista de influências e retirar uma cartada perfeita da manga.
Nesse caso, a cartada perfeita foi a referência ao quadro Hypnosis, de Sascha Schneider, que espelha um dos momentos mais instigantes do filme de Eggers quando, já no auge do confinamento, os personagens de Robert Pattinson e Willem Dafoe se confrontam.
Diversas outras pinturas também estiveram na mente de Eggers enquanto o diretor pensava em seu trabalho em O Farol, como Untitled, de Jean Delville (acima), e Lighthouse Hill, de Edward Hopper (abaixo).
Head of a Bacchante x Midsommar
Midsommar foi um daqueles sucessos que gera burburinhos até hoje. Independentemente de qual é a opinião do espectador — se amou ou odiou a obra —, é difícil criticar seu trabalho artístico. Um filme de horror, sendo feito à luz do dia, com tantas cores claras e figuras nítidas, é, também, um trabalho bastante arriscado, mas que foi realizado com competência por Ari Aster e sua equipe.
Assim como O Farol, diversos momentos e cenas em Midsommar parecem saídos de alguma pintura, mas talvez o caso mais claro de inspiração está mais ao final do longa, quando Dani (Florence Pugh), atinge sua catarse, e suas feições nos levam ao quadro Head of a Bacchante, de Annie Louisa Swynnerton.
Ophelia x Fatal Frame
Você já deve ter visto a famosa pintura de John Everett Millais por aí. Inspirada na personagem de mesmo nome de Hamlet, de Shakespeare, Ophelia se afogou em um lago após todos os desencontros que teve em sua vida — o amor que não sente ser correspondido por Hamlet, a morte de seu pai, o sumiço de seu irmão.
O quadro também foi bastante referenciado na cultura pop, mas talvez uma das referências mais diretas dentro do terror seja no filme de Mari Asato, Fatal Frame, baseado no jogo de mesmo nome. Ambas as imagens são bastante parecidas e logo a cena do filme nos remete à pintura.
Study for Lady Macbeth x Carrie
Outra personagem de Shakespeare a figurar entre as inspirações de cenas de filmes de terror é Lady Macbeth, na famosa pintura de Gustave Moreau, que serviu de referência para uma das maiores cenas de Carrie, de Brian de Palma.
A ideia de que ambas personagens, em determinado momento, perdem o controle de suas ações — mesmo que por motivos tão diferentes —, pode ser vista como um dos motivos para que essa imagem de Moreau seja evocada por De Palma.
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Young Woman of the People x It: A Coisa
Aquele quadro pelo qual o personagem Stanley (Wyatt Oleff), em It: A Coisa, sente tanto medo não é parecido com Young Woman of the People, de Amedeo Modigliani, por coincidência. O quadro foi incorporado daquela forma, com essa referência, por um medo de infância do próprio diretor, Andy Muschietti.
Muschietti contou em uma entrevista ao The New York Times que a escolha dessa imagem para os pesadelos de Stan é porque ele mesmo tinha em casa uma cópia desta pintura e a achava aterrorizante.
American Gothic x Rocky Horror Picture Show
American Gothic, de Grant Wood, apesar de sua pouca idade (datando de 1930), se tornou bastante clássica aos olhos americanos, sendo exaustivamente parodiada ao longo destes quase 100 anos desde que foi criada. Uma dessas vezes foi em Rocky Horror Picture Show, um dos maiores musicais de terror já feitos.
Logo no início do filme, quando Janet e Brad ainda não partiram em viagem, podemos avistar Riff Raff (Richard O’Brien) e Magenta (Patricia Quinn) vestidos como os personagens da pintura na porta da igreja.
A pintura ainda aparece no filme outras duas vezes: ao lado do caixão na mansão de Frank-N-Furter (esquerda), e já mais ao final do filme, como releitura (direita).
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Abaixo, linkamos os dois vídeos que inspiraram o texto. Criados por Narachamus, no canal do Youtube The Horror Show, os vídeos demonstram vários outros quadros que serviram como referência para filmes de terror de diversas nacionalidades.
Se lembra de mais alguma cena icônica que poderia ser baseada em um quadro? Comente este post com a Macabra no Twitter e Instagram.