Diretoras Macabras: o onírico e o feminino nos filmes de Monica Demes

Narrativas fantásticas nascem nas mãos de Monica Demes, que leva seus espectadores a um mundo de sonhos e pesadelos.

Conhecida entre uma parcela de fãs de filmes brasileiros de horror, Monica Demes é uma das novas vozes de destaque no cinema de gênero, uma diretora que se utiliza do onírico e do erótico, atrelados aos elementos de horror, para conduzir suas narrativas fantásticas e macabras.

A brasileira Monica Demes se formou em Direito pela PUC-Rio, mas sabia que não era o caminho que queria trilhar. Mudou-se para Madri, onde viveu por 11 anos, e cursou Cinema. Como costuma acontecer quando a paixão se conecta à sensibilidade, a diretora construiu uma linguagem própria para contar histórias emocionantes no cinema, e coletou prêmios para muitos de seus curtas — e também para o seu primeiro longa, O Despertar de Lilith.

O longa de Demes é a última de suas produções até o momento. Antes dele, a carreira da diretora foi ampla em contribuições ao cinema e ao horror. Repleta de situações fantásticas, utilizando o onírico para retratar os desejos reprimidos de suas personagens, a diretora gosta de trabalhar com as filmagens em preto e branco. Para ela, o preto e branco demonstra que você sai da vida real, que avança para um caminho de sonhos.

Seu primeiro curta, chamado Rose, lançado em 2003 durante um workshop da New York Film Academy, nos conta sobre uma mulher que tem um sonho recorrente com algo que acaba alterando completamente o rumo de sua vida. O curta participou de uma série de festivais na Europa. Em seguida, em 2005, já na Espanha, Demes dirigiu o curta Ahora Serás Castigada, um de seus poucos trabalhos feitos em cores. O curta é sobre um jogo erótico, também participando de muitos festivais pelo mundo.

Em 2012, Monica lançou um documentário chamado Diario de una Hechicera, que mescla os idiomas inglês e espanhol, sobre suas experiências com a espiritualidade baseadas na terra, uma viagem pelo atual mundo pagão na Inglaterra e em como isso alterou sua perspectiva do mundo, como ela mesma afirma em sua conta no site Culture Unplugged, onde o documentário se encontra disponível. Para ela, é uma tentativa de desmistificar o que é a feitiçaria, abordando um estilo de vida que tem grande apreço.

Em parceria com o artista Carmelo Calvo, em 2011, a diretora lança o curta em animação Halloween, que acompanha uma garotinha que esculpe uma careta em uma abóbora para a data, e, ao mostrar para seus pais, nenhum deles se importa muito — o que é definitivamente um erro. O curta foi um sucesso, passou por mais de 30 festivais na Europa e recebeu prêmios, como o prêmio da audiência como melhor curta no Festival de Cinema de Elche, na Espanha.

Quando David Lynch viu Halloween, disse ao diretor de seu curso de cinema na Maharishi University (MUM), Gurdy Leete, que Demes deveria estudar lá. O consagrado diretor ofereceu um prêmio a ela, e foi durante o mestrado de David Lynch, em Iowa, em que trabalhou na história de seu primeiro longa, com os auxílios e opiniões do diretor fazendo toda a diferença em seu trabalho.

De início Demes estava com dificuldades em encontrar o caminho para esse roteiro. Conta que estava bloqueada, não conseguia prosseguir, quando Lynch perguntou a ela: “Por que você está bloqueada? Você está mentindo”, e ao aceitar os conselhos do diretor para alterar o personagem principal do filme, que antes era um homem, e transformá-lo em uma mulher, as coisas fluíram de forma melhor e ela terminou o roteiro.

Na campanha para financiamento do longa no site Indiegogo, que ainda se encontra disponível para acesso mas já encerrada para apoios, Demes afirma que sempre foi fascinada por vampiros, desde que assistia aos filmes tarde da noite, junto de sua avó, e sempre quis ser uma dessas criaturas. “Por que eu ia querer ser médica ou advogada, quando eu podia voar como um morcego, controlar as forças da natureza e morder belos pescoços?”, escreve na campanha. Então, não deve ser surpresa que a diretora tenha se enveredado pelos caminhos do horror, e que tem feito isso muito bem.

O Despertar de Lilith, além de uma excelente história de vampiros, com alguns nomes de personagens que conhecemos muito bem dessa mitologia — a personagem principal se chama Lucy e temos também um Arthur, Morris e Jonathan —, é uma narrativa que explora elementos já consagrados nessas narrativas: o medo, o sexo, a luxúria, o horror de uma criatura estranha que te domina e manipula muito melhor do que você mesmo se conheceria.

O filme também passou por vários festivais, recebendo prêmios no Brasil e em outros países. A cantora brasileira Barbara Eugenia fez o papel de Lilith, na qual Demes afirma em entrevista para a Decay Mag de que havia pensado diretamente nela ao escrever o papel. Eugenia nunca havia atuado antes, mas, ainda sim, Demes sabia que tinha que ser ela no papel. E, acabou dando muito certo. A conexão de Lilith com Lucy é visível, e a forma como o filme se desenrola mostra a potência da cantora como atriz.

Ainda durante a entrevista, a diretora conta como foi o horror que a escolheu, e não ela que escolheu o gênero. Como mencionado, Demes assistia a esses filmes desde pequena e sempre foi fascinada por criaturas sombrias, com esse tema reverberando em seu trabalho mesmo que em linhas menores e mais sutis. Independente do curta feito durante sua carreira, e principalmente em seu longa, notamos elementos típicos das narrativas de horror.

De acordo com a entrevista da diretora ao site DecayMag, seu próximo projeto será um thriller psicológico em um conservatório de música. Estamos ansiosos para conferir.

Monica Demes é somente um dos nomes de diretoras que tem feito um trabalho excelente dentro do gênero do horror. Ao lado de Gabriela Amaral Almeida, Juliana Rojas, Anita Rocha da Silveira e tantas outras, Demes demonstra uma grande consciência diante de seu trabalho, com escolhas acertadas e sensíveis diante dos temas que se dispõe a tratar. Com o que conferimos até aqui, e torcemos para que ainda tenha uma longa carreira, só ficamos ainda mais na expectativa do que está por vir.

Gostou de saber um pouco mais sobre a carreira da diretora Monica Demes? Comente com a Macabra no Twitter e no Instagram. Saiba mais sobre a diretora no Film Fatales, Gazeta News e Decay Mag.

Compartilhe:
pin it
Publicado por

Acordo cedo todos os dias para passar o café e regar minhas plantas na fazenda. Aprecio o lado obscuro da arte e renovo meus pactos diariamente ao assistir filmes de terror. MACABRA™ - FEAR IS NATURAL.