Final Girls: as sobreviventes do horror

Expressão cunhada por Carol J. Clover, saiba quem são, por que estão tão apavoradas e quais são algumas de nossas Final Girls macabras preferidas.

Talvez o termo Final Girl não lhe seja muito familiar, mas você está mais acostumado com ele do que imagina. A expressão foi cunhada pela professora universitária Carol J. Clover em seu livro Men, Women, and Chainsaws: Gender in the Modern Horror Film

De acordo com a autora, Final Girls são as grandes sobreviventes dos filmes de terror, geralmente slashers, que devem confrontar o assassino ao final do filme, quando todos os seus amigos já foram brutalmente massacrados. Além disso, há outras características que ajudam a compor o imaginário da Final Girl:

– Geralmente é uma moça jovem;

Virginal, pura e/ou sexualmente indisponível;

– Em muitos casos possui um nome unissex (Sindey, Ripley, Jamie…);

– Normalmente ela compartilha alguma história com o assassino;

– Enfrenta o vilão no final com um objeto simbolicamente masculino.

(Se você se identificou com todas as alternativas, é bem possível que você seja uma Final Girl)

A simbologia na ideia de Final Girl dá margem para algumas interpretações, em alguns casos, paradoxais. A explicação mais simples é a celebração ao puritanismo, às personagens imaculadas, mesmo diante do mal. Pode ver, há sempre algum tipo de moralismo na escolha dos personagens que irão morrer ao longo do filme: eles são promíscuos, bebem, usam drogas ou fazem qualquer coisa que os pais não gostariam que seus filhos fizessem. Mas a Final Girl está acima disso e é isso o que a torna uma sobrevivente.

Há também a vertente feminista da Final Girl. Afinal, ela é a “consciência investigativa” do filme, que leva a narrativa adiante e resolve a charada através da sua inteligência, curiosidade e vigilância, certo? Se a gente olhar bem de perto nem sempre é assim. Apesar de sua natureza pura, esta personagem geralmente é masculinizada através do que Carol J. Clover chama de “apropriação fálica”, ao utilizar uma arma inconscientemente masculina (faca, machado, serra elétrica…) para, enfim, confrontar o assassino.

A ideia desta masculinização e dos nomes unissex é facilitar a identificação dos homens com estes filmes. Mas então, por que não utilizar protagonistas masculinos, já que o terror e principalmente os slasher são geralmente direcionados a homens? A explicação mais simples da acadêmica é de que a protagonista deve vivenciar o mais desgraçado dos horrores, ela precisa estar apavorada. Não preciso dizer que a ideia de um homem tão profundamente apavorado não atrairia muita gente aos cinemas, não é? Como o nome original de Pânico já define: a galera é atraída pelos gritos.

Ao mesmo tempo em que pode significar uma celebração da força, inteligência e instinto de sobrevivência das mulheres, a ideia das Final Girls acaba se perdendo um pouco no tempo, com a necessária masculinização da personagem e a ideia de que a virgindade é a salvação. Não por acaso, vários filmes hoje em dia satirizam este conceito, como é o caso de O Segredo da Cabana.

8 Final Girls que amamos

Ao longo das últimas décadas, desde o seu surgimento nos anos 1970, as Final Girls se tornaram um patrimônio do cinema do terror. A fórmula foi evoluindo e se adaptando aos novos tempos. A seguir celebramos algumas das mais icônicas (e das nossas preferidas):

1. Sally Hardesty

Final Girl: Sally, Massacre da Serra Elétrica
O Massacre da Serra Elétrica, 1974 // Esta é provavelmente a primeira Final Girl já registrada, em um filme que praticamente inaugurou o gênero slasher para audiências maiores. Apesar do gênero ainda não estar completamente lapidado, Sally Hardesty (Marilyn Burns) já se consagrou como uma das melhores sobreviventes do cinema. Além de ter sido aterrorizada ao ver seu irmão, namorado e amigos brutalmente assassinados, ela sobrevive a uma família de canibais com um arsenal bizarro de ferramentas para preparar o jantar. Ela escapa mais por sorte do que por qualquer outra coisa, e sua risada insana no final já é motivo pra gente respeitar ainda mais a personagem.

2. Laurie Strode

Final Girl: Laurie, Halloween
Halloween, 1978 // Quatro anos após O Massacre da Serra Elétrica, o conceito do slasher e da Final Girl foi lapidado e se tornou tendência com Laurie Strode (Jamie Lee Curtis). Trabalhando como babá na noite de Halloween, Laurie é a colega virgem, reforçando o arquétipo das Final Girls. Todos os seus amigos são brutalmente assassinados por um homem que foge de uma instituição psiquiátrica após 15 anos, normalmente quando eles estão em situações promíscuas. Como o assassino escolhe aleatoriamente suas vítimas, Laurie não se salva somente pela virgindade, ela só parece ser a única atenta o suficiente aos seus arredores para saber quando uma ameaça se aproxima. Na continuação feita em 2018 a personagem retorna à franquia com o amadurecimento da idade: além do estresse pós-traumático do Halloween de 78, ela se preparou para enfrentar novamente Michael Myers.

3. Ellen Ripley

Final Girl: Ripley, Alien
Alien, o Oitavo Passageiro, 1979 // Temos Final Girls na ficção científica também! Mas aqui nos limitamos ao primeiro filme, já que os seguintes saíram um pouco do terror e migraram pro gênero de ação. Apesar de originalmente a personagem ter sido concebida como homem, Ripley (Sigourney Weaver) não é um caso de masculinização de personagem feminina. Ela é simplesmente uma personagem inteligente e a mais esperta entre seus colegas de trabalho. Aliás, ela lida com uma decisão infeliz do capitão da nave: de trazer um tripulante infectado com um alien para o meio deles. Sua sagacidade em pesquisar uma solução em vez de entrar em pânico é o que faz com que ela seja a única a escapar com vida do gosmento alien.

4. Nancy Thompson 

Final Girl: Nancy, A Hora do Pesadelo
A Hora do Pesadelo, 1984 // Lá pelos anos 1980 as Final Girls ficaram ainda mais espertas quando o assunto é enfrentar psicopatas homicidas. Nancy Thompson (Heather Langenkamp) não está diante um homem de carne e osso, mas sim de um monstro que consegue matar suas vítimas do além-túmulo através dos sonhos. Ela consegue decifrar o mistério das mortes violentas de seus amigos durante o sono e ainda atrai o assassino para uma armadilha, deixando claro que a inteligência é uma arma mais poderosa do que as assustadoras garras de Freddy Krueger.

5. Kirsty Cotton

Final Girl: Kirsty, Hellraiser
Hellraiser: Renascido do Inferno, 1987 // A fantasia sadomasoquista de Clive Barker não segue bem a fórmula tradicional dos slashers, porque isso seria uma definição simplória do filme. Mas Kirsty Cotton (Ashley Laurence) se encaixa no arquétipo da sobrevivente. Ao longo de três filmes ela se vê invocando os demônios cenobites e, apesar de sempre parecer haver uma lógica pra isso, Pinhead tem um ponto válido ao dizer que a protagonista faz isso por, lá no fundo, querer conhecer os prazeres da tortura

6. Sidney Prescott 

Final Girl: Sidney, Pânico
Pânico, 1996 // Diferentemente de outros slashers, Sidney Prescott (Neve Campbell) se tornou a verdadeira estrela de sua franquia (apesar da popularidade da máscara do assassino). Ela deixou de ser a adolescente aterrorizada para se tornar uma personagem mais completa, com um verdadeiro arco que é desenvolvido ao longo de sua jornada. Ela também quebra o estereótipo da heroína virgem, mudando este status logo no primeiro filme e vivendo pra contar a história em mais três sequências. Aliás, é um dos raros casos em que a franquia se mantém consistente ao longo de suas continuações (embora o primeiro ainda seja o melhor). Sidney deixa de ser a adolescente aterrorizada para desenvolver o sua jornada em torno do legado do assassino do primeiro filme, que passou a receber imitações ao longo dos anos.

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7. Grace 

Final Girl: Grace, Casamento Sangrento
Casamento Sangrento, 2019 // Existe algo mais puro e virginal do que uma mulher com seu vestido de casamento, na noite de seu casamento? Visualmente sim, mas Grace (Samara Weaving) não é nada disso. Apesar de querer agradar a família de seu marido em plena noite de núpcias, ela não é nada ingênua quando o jogo que eles começam a jogar parece ter um perdedor claro: ela. Seu instinto de sobrevivência não tem limites e, se isso envolver matar seus novos parentes, azar o deles. Apesar de não se encaixar na forma dos slasher tradicionais, Casamento Sangrento mostra um amadurecimento da fórmula carregado de altas doses de ironia. Lembre-se deste filme sempre que pensar em familiares tóxicos.

8. Dani 

Final Girl: Dani, Midsommar
Midsommar: O Mal não Espera a Noite, 2019 // Midsommar definitivamente não é um slasher, não tem um assassino malvado e vai entrar muito mais profundamente debaixo da sua pele. Ainda assim, Dani (Florence Pugh) é um ótimo exemplo do que as Final Girls representam no nosso dia a dia. Após sofrer um trauma familiar dos brabos, ela viaja com o namorado (boy lixo alert!) e os amigos dele para uma comunidade na Suécia durante o verão, quando o sol nunca se põe. O que parecia só uma viagem de férias de curiosidade cultural acaba virando um pesadelo psicológico em que todos os amigos misteriosamente desaparecem. Dani encerra o filme provando que, um dia, os humilhados realmente serão exaltados.

Se você quer entender melhor Midsommar clique aqui.

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Renunciei à vida mundana para me dedicar às artes da trevas. No meu cálice nunca falta vinho ungido e protejo minha casa com gatos que afastam os espíritos traiçoeiros. MACABRA™ - FEAR IS NATURAL.