Depois de séculos de imagens e cenas de horror acumuladas, O Solar do Diabo (no original, Le Manoir du Diable) pode parecer bem pouco assustador, mas tenha em mente que esse filme foi produzido em 1896, e que as pessoas possivelmente não estavam preparadas para o que presenciaram.
O idealizador do grande monstro de pouco mais de três minutos que começaria a mudar a história do cinema para sempre foi o gênio francês dos efeitos especiais, Georges Méliès. Ele também é bastante conhecido por ser um ilusionista, além de sua silenciosa fantasia de ficção científica Viagem à Lua (o filme apresenta um grupo de astrônomos que viajam para a Lua em uma cápsula disparada por um canhão, exploram a superfície da Lua, escapam de uma grupo subterrâneo de habitantes lunares, os selenitas, e retornam à Terra com um selenita cativo) e pelo tributo pago a ele em Hugo, de Martin Scorsese.
O primeiro curta de terror
Quanto a O Solar do Diabo, a história quase não é uma história, mas ainda assim existe algo ali, algo especial. Tudo começa com um morcego que entra em um castelo e se transforma em Mefistófeles. Ele então se levanta sobre um caldeirão e evoca uma garota, também alguns fantasmas e esqueletos e bruxas (e um assistente com um tridente). Entram em cena dois cavalheiros. Eles são atormentados pelas entidades e no final das contas um deles enfrenta o Diabo, brandindo um grande crucifixo e fazendo com que o demônio desapareça.
Como dissemos, a história mal parece uma história, mas a imagem possui alguns cortes bem estranhos, e é exatamente aí que se encontra a mágica. Na verdade, não é bem uma mágica, mas uma técnica que Méliès supostamente descobriu naquele mesmo ano.
No site da OpenCulture há um trecho informando que, no outono de 1896, ocorreu um evento que passou para o folclore cinematográfico e mudou a maneira como Méliès via o cinema. Enquanto filmava uma cena de rua simples, a câmera do Méliès ficou enroscada e levou alguns segundos para voltar ao funcionamento normal. Não pensando mais sobre o incidente, Méliès processou o filme e ficou impressionado com o efeito que tal incidente teve na cena — objetos apareceram de repente, desapareceram ou foram transformados em outros objetos.
Foi desse modo que nasceu O Solar do Diabo, tecnicamente o primeiro filme de terror, e um dos primeiros filmes — provavelmente o primeiro — a usar deliberadamente efeitos especiais para assustar os espectadores. Mas o filme também apresentava vários ícones de terror, como fantasmas, caldeirões ferventes, o diabo e até mesmo o primeiro vampiro na tela! Mais do que tudo isso, pode conter o primeiro “Tridente espetado na bunda” a ser visto em um filme.
O Solar do Diabo foi feito sob a direção de um homem que, segundo Walt Disney, “descobriu os meios de colocar a poesia ao alcance do homem na rua”. Georges Méliès dirigiu dezenas de outros filmes até a sua morte, em 1937, e é reconhecido como um dos primeiros mestres do cinema.
Para jogar um pouco mais de pimenta nesse caldeirão, alguns dizem que O Solar do Diabo não foi inteiramente um filme de horror, mas uma comédia de terror. Em contrapartida, outros argumentam que as imagens satânicas, os espectros e os esqueletos na tela fazem com que ele se encaixe no gênero de terror, apesar dos ângulos cômicos.
Em uma nota mais estranha ainda, poderia haver um outro filme a ser considerado um filme de horror que precede O Solar do Diabo. É um clipe muito curto intitulado A Execução de Mary Stuart (no original, The Execution of Mary Stuart). Mary Stuart, Rainha dos Escoceses é decapitada por traição. Quem o produziu? O grande inventor Thomas Edison, em 1895.
Assista O Solar do Diabo
Assista A Execução de Mary Stuart
Assista Viagem à Lua
Leia mais nas fontes consultadas: Open Culture, Human Echoes, Wikipedia.