Vilarejo amaldiçoado, demônios indonésios, turba popular enfurecida, espíritos de crianças, casarão cercado por infortúnios e teatro de sombras: esse é o novo filme do diretor Joko Anwar, mais conhecido pelo sucesso de bilheteria na Indonésia Satan’s Slaves, de 2017, e The Forbidden Door, de 2009.
O filme já começa prendendo a atenção. Maya (Tara Basro), a protagonista, aparece trabalhando em um pedágio de madrugada, conversando por celular com a sua melhor amiga Dini (Marissa Anita), isolada na sua cabine, recebendo dinheiro, liberando a catraca pros veículos. Começa então a falar de um certo motorista que sempre a deixa arrepiada quando passa. De repente, não demora para que o motorista mencionado surja, pague o pedágio, passe direto, estacione o carro e volte andando até ela. Ele a chama por outro nome e fica questionando se ela é da Vila Harjosari, faz perguntas sobre seu pai, a deixa desconfortável. Dini, que ainda estava no telefone com a amiga, pede para que ela se tranque na cabine enquanto avisa aos supervisores para chamarem um segurança. Mas tudo parece se resolver, visto que ele retorna pro carro. Entretanto, o motorista assustador retorna com um facão e diz sombriamente: “nós não queremos o que a sua família deixou para trás”. Este é o início do pesadelo.
A história se desenvolve a partir do retorno de Maya ao seu vilarejo natal, que abandonou ainda pequena, com a ambição de vender o casarão desabitado da família. Acompanhada da divertida Dini, elas têm a esperança de que, com o dinheiro da herança, vão poder investir no próprio negócio. Fingindo serem estudantes, fazem uma longa viagem para o interior do país, alternando entre ônibus e uma charrete, para chegar na Vila Harjosari. Uma vila esquecida pelo tempo, desolada e, curiosamente, sem crianças.
A história do filme transcorre com o encontro de duas forças opostas: o medo unido à necessidade de descobrir o passado, o temor pelo futuro, a busca de Maya por suas raízes, o abandono que sofreu por seus próprios pais, o desespero de uma cidade onde as mulheres grávidas viviam o pavor de que seus bebês nasçam amaldiçoados e mortos. E é justamente esse terror de não ter descendentes que faz com que os moradores se agarrarem a crenças e superstições, dispostos a qualquer extremo, incluindo magia obscura e rituais de sacrifício, para revogar a maldição.
Surpreendentemente bem filmado e com uma ótima atmosfera noturna, o filme tem um ritmo que estamos acostumados do cinema ocidental. Embora a narrativa seja conhecida, a mistura do regionalismo cultural indonésio (sempre com o cuidado em ambientar a audiência), com uma fotografia e cenários peculiares — ainda unindo elementos como demônios e espíritos — nos proporciona uma experiência bastante singular.
A estética da mansão abandonada invadida pela vegetação com os teatros de sombras que tem um forte simbolismo na cultura indonésia foi uma boa decisão para ambientar a história. Na cultura indonésia, os titereiros, chamados dalangs, contam histórias e passam os ensinamentos através de um espetáculo chamado Wayang Kulit, em que personificam todas as vozes dos fantoches, que normalmente são feitos com varetas e pele de búfalo, onde a luz das velas faz a dinâmica das sombras tomarem vida.
Toda essa pegada sobrenatural misturada com crenças locais faz do Impetigore uma novidade pra quem já está cansado dos mesmos padrões de personagens e referências. Mesmo com uma violência visceral e todo o suspense, o filme também tem bons momentos de descontração. Pode não te deixar com medo de apagar a luz, mas você vai pensar duas vezes antes de ir atrás de vender aquele casarão abandonado que o seu tio te deixou de herança.
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