William Castle: o mestre do marketing aterrorizante

De esqueletos voando pelo cinema a um suposto seguro de vida para uma barata, William Castle usou de muitos truques para chamar a atenção para seus filmes.

Antes de A Bruxa de Blair causar furor afirmando que suas filmagens eram reais, e antes de, a cada semana, termos um filme afirmando que seus espectadores passaram mal dentro das salas de cinema, houveram outras técnicas de marketing — agressivo, podemos dizer — para chamar a atenção de fãs de terror. Ao longo da década de 1950 e 1960, os filmes B precisavam de uma forcinha para atrair sua audiência até o cinema.

Uma das maiores personalidades do gênero de sua época, William Castle foi ator, roteirista, produtor, diretor, mas, acima de tudo, foi um marketeiro de marca maior. A forma que Castle realizava o marketing de seus filmes era uma arte à parte.

Cheio de truques na manga, Castle era um completo showman: carismático, conseguiu surpreender sua plateia de diversas formas, ora com objetos de cena voando pelo cinema, ora com versões ligeiramente diferentes de seus filmes, a depender de onde este seria exibido. O fato é que Castle se divertia com suas ideias brilhantes — mesmo que, às vezes, elas dessem um pouco de dor de cabeça a ele. 

A Macabra relembra a carreira deste artista multitalentoso, que aprendeu seu ofício tão cedo com uma boa dose de criatividade.

De início, o Drácula

William Castle se tornou órfão aos 11 anos, e aos 13 se deu outra grande mudança em sua vida. Nessa idade, ainda tão cedo, ele foi assistir a uma peça de teatro protagonizada por um ator estrangeiro. Drácula, com Bela Lugosi, fez um sucesso considerável nos teatros no final da década de 1920, e foi ao assistir a peça que Castle teve tanta certeza do que queria fazer na vida: ele queria assustar as pessoas. Em sua biografia Step Right Up! I’m Gonna Scare the Pants off America, ele conta que foi naquele exato momento que pensou ter encontrado sua profissão.

Dois anos depois, Castle largava a escola e pegava a estrada para a tour da peça — recomendado pelo próprio Lugosi. Mas esse era só o primeiro passado para uma carreira longa e extremamente frutífera, que, com sua criatividade e a falta de vergonha na cara, lhe rendeu algumas histórias notáveis.

Um boato sensacionalista

Stony Creek Theater

Uma dessas histórias se deu algum tempo depois daquele primeiro encontro que mudou sua vida. Já sabendo que queria trabalhar com teatro e atuações dignas de aterrorizar seu público, Castle conseguiu o telefone de Orson Welles para alugar o Stony Creek Theatre, em Connecticut. Welles estava deixando o teatro para se dedicar às gravações de Cidadão Kane, então Castle conseguiu o local sem grandes problemas. Os problemas, é claro, viriam depois.

Ao contratar a atriz alemã Ellen Schwanneke, Castle não sabia que uma das novas regras da associação do teatro naquele momento (com o nazismo crescendo na Alemanha) era que atores alemães só poderiam trabalhar em peças originalmente alemãs. Então, para tentar burlar a regra, em um momento que a internet não estava disponível e que as informações demoravam a ser checadas, Castle disse que Schwanneke fora contratada para a peça (que não existia) Das ist nicht für Kinder (Isso não é para crianças, em tradução livre). Castle então correu para escrever a peça e traduzi-la para o alemão no mesmo final de semana.

Enquanto isso, Schwanneke foi convidada pelo governo nazista alemão a se apresentar em seu país natal, mas Castle percebeu uma oportunidade melhor: ele divulgou para a imprensa um suposto telegrama que teria enviado como resposta, afirmando que Schwanneke não se apresentaria coisa nenhuma, tornando a atriz conhecida como “a mulher que disse não a Hitler”. Para aumentar seu sucesso na divulgação da peça, com uma ajudinha do sensacionalismo, Castle ainda depredou o teatro, afirmando que simpatizantes nazistas haviam feito aquilo.

A tática funcionou, e a peça atraiu muitos olhares. Desde esse ponto, Castle já dava uma ideia de suas técnicas de divulgação.

William Castle: produtor

Orson Welles e William Castle

Quando tinha 23 anos, Castle decidiu tentar a vida em Hollywood. Seu primeiro trabalho lá foi na Columbia Pictures, com Harry Cohn, e logo partiu para dirigir alguns diálogos no filme Melodias do Meu Coração (1940). Seguindo ainda nessa mesma direção, ele também trabalhou como produtor associado em A Dama de Shanghai (1947), de Welles. 

Mas talvez seu maior sucesso como produtor foi com O Bebê de Rosemary — o que, para Castle, não foi exatamente um sucesso. Acontece que Castle hipotecou sua casa (não se sabe quantas vezes Castle hipotecou sua casa ao longo de sua vida para fazer filmes) e comprou o livro de Ira Levin antes mesmo dele ser publicado, pois esperava finalmente dirigir um filme de alto nível. Então, fez um acordo com a Paramount, que insistiu que o filme fosse dirigido por Polanski, restando para Castle somente a produção do longa.

William Castle em O Bebê de Rosemary

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Mas Castle também faz uma pontinha no filme como um homem de cabelos grisalhos que está do lado de fora da cabine telefônica, enquanto Rosemary tenta fazer um telefonema.

Os truques de marketing

Entretanto, quando pensamos em William Castle, lembramos de outro grande talento que ele tinha. Seu trabalho excêntrico para criar atrações para seus filmes, mesmo que nem todas funcionassem como deveriam, tornou Castle um dos mais queridos produtores de terror da metade do século XX.

Sua primeira grande aventura com esses truques de marketing foi com A Casa dos Maus Espíritos. Dirigido por Castle e estrelado por Vincent Price, o filme conta a história de um homem muito rico, disposto a dar uma grande quantia em dinheiro para quem conseguir passar a noite em uma casa assombrada. Em dado ponto do filme, um esqueleto surpreende um dos personagens. Neste exato momento, na sala de exibições, um esqueleto de olhos vermelhos também salta de um determinado local para assustar a plateia, voando sobre ela. O efeito foi chamado por Castle de “Emergo”.

Já em Força Diabólica, outra colaboração de sucesso entre Price e Castle, o truque foi chamado de “Percepto”. Para este, Castle comprou alguns descongeladores de asas de aviões, que tinham motores vibratórios, e viajava com uma equipe prendendo-os em alguns assentos dos cinemas. No filme, um parasita que só pode ser morto através de gritos escapa, e em um momento de quebra da quarta parede, Price pede que a audiência grite por suas vidas. Então, os motores eram acionados. 

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Mas, talvez, o truque mais famoso de Castle tenha sido em 13 Fantasmas. Lançado em 1960, ele chamou seu truque de “Illusion-O”. Para a audiência eram distribuídos óculos especiais para ver/desver fantasmas — com uma lente vermelha e uma lente azul. Ao longo do filme, quando os fantasmas apareciam, surgia também um aviso para que os espectadores colocassem os óculos. Caso se quisesse ver os fantasmas, usavam a lente vermelha. Caso contrário, era só olhar pela lente azul. As cópias do filmes que se seguiram depois vieram com as mesmas cenas e avisos, e os primeiros DVDs e VHS também eram acompanhados dos óculos especiais.

Até 1975, Castle continuou com seus truques para atrair audiência. E, na maior parte das vezes, funcionou. Entre brindes especiais e brincadeiras com a plateia, Castle conseguia chamar a atenção para seu trabalho. Em A Moderna Mata Hari (1963), Castle entrou em uma busca por “mulheres bonitas” de quinze países diferentes, e gravou cenas que evidenciavam essas jovens para diferentes versões do filme, que foram exibidas nos países em que cada uma pertencia. Já em Praga Infernal (1975), último filme produzido pelo artista, havia o anúncio de que a estrela do filme, Hércules, a barata, tinha um seguro de vida de 1 milhão de dólares feito pela produção.

Logo as brincadeiras de Castle ficaram datadas. Era difícil acompanhar todos os lançamentos. Mas os filmes B de Castle se consagraram principalmente pelas tentativas do produtor de atrair a atenção do público. Ao longo dos anos seguintes, podemos dizer que muitos produtores aprenderam com o marketing de Castle a chamar a atenção de sua audiência — seja com anúncios sensacionalistas ou truques de divulgação.

O legado

Castle faleceu em 1977, mas sua história permanece viva entre os fãs de um bom marketing e das histórias de terror. Um desses fãs é John Waters, que considera Castle seu diretor favorito. Em Crackpot: The Obsessions of John Waters, o artista conta que Castle era seu ídolo: “Os filmes dele me fizeram querer fazer filmes. William Castle era Deus”.

John Waters interpretou William Castle na série Feud

Castle também é o diretor favorito de Robert Zemeckis, diretor da trilogia De Volta Para o Futuro, A Morte lhe Cai Bem e Forrest Gump. Zemeckis, ao lado de Joel Silver e Gilbert Adler, fundou a Dark Castle Entertainment, em homenagem a William Castle. Desde sua fundação, em 1998, a Dark Castle realizou alguns remakes dos filmes de Castle, como A Casa da Colina (1999, remake de A Casa dos Maus Espíritos), e 13 Fantasmas (2001), além de ser a produtora de filmes como A Órfã (2009) e Órfã 2: A Origem (2022).

Sua filha, Terry Ann Castle, trabalhou ao lado da Dark Castle Entertainment para trazer as produções de seu pai de volta à vida. 

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Castle é um dos grandes nomes na arte de aterrorizar sua plateia. Já conhecia os filmes do diretor? Qual o seu favorito? Comente com a Macabra no Twitter Instagram.

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Acordo cedo todos os dias para passar o café e regar minhas plantas na fazenda. Aprecio o lado obscuro da arte e renovo meus pactos diariamente ao assistir filmes de terror. MACABRA™ - FEAR IS NATURAL.