Game de terror coloca jogador em pressão absoluta

Mother é um game indie de terror psicológico bastante perturbador. Entrevistamos o criador do jogo para entender suas referências e intenções com os jogadores.

Mother é um game indie de terror psicológico bastante perturbador. Com uma proposta imersiva bem intensa, ele coloca o jogador em primeira pessoa para mergulhar em uma espiral de loucura.

O game começa com o suicídio de um homem que deixa para trás sua esposa e um casal de filhos. Sem entender o motivo, abalada e transtornada, a então parceira se vê com uma rotina intensa e perturbadora, noite após noite. Mas há algo de ainda mais monstruoso à espreita, algo sombrio que observa das trevas.

Mother é o primeiro projeto do game designer canadense Irwin Segarane. “Fico bastante tempo tentando aprender coisas novas, e também testando ideias para jogos. Criar jogos requer muito conhecimento técnico, então quero continuar aprendendo até chegar ao ponto de conseguir realizar a maior parte das ideias por conta própria”, conta Irwin.

Ficamos tão impactados com a experiência encontrada em Mother, que o caminho foi tentar entender melhor o seu criador o que está por trás do jogo, e você confere exatamente isso na entrevista a seguir.

  • Como Mother nasceu? Quanto tempo até ficar pronto? O conceito original foi mantido? O jogo final saiu exatamente como você planejou?

Queria fazer um jogo em que você defende outros em vez de se defender. Passei um ou dois meses apenas trabalhando na ideia, discutindo com um amigo que também me ajudou com os conceitos visuais. Inicialmente, queria que o jogador protegesse não apenas seus filhos, mas também a vovó e o vovô! Mas isso era muito complexo e tive que reduzir o escopo do jogo. Também acho que só ficar com os filhos reforça melhor o tema da mãe. Gosto de pensar sobre histórias ou temas antes de começar a trabalhar na mecânica de jogo, então, na época, não tinha ideia de como seria a ação do jogador. Então comecei a fazer o protótipo do jogo e comecei a procurar uma jogabilidade que se encaixasse no meu tema. Demorou muito tempo e iteração, e tive que jogar fora muitas ideias/trabalhos, mas depois de um ano consegui alcançar algo que realmente gostei. No final das contas, o jogo permaneceu bastante semelhante à ideia que tive no início, e estou muito feliz com isso porque acho que dá uma direção consistente.

  • Mother lida com questões muito pesadas, como suicídio. Como foi abordar esses temas no jogo?

Acho que o terror é um bom meio para falar sobre assuntos mais pesados e sombrios. Momentos assustadores ou tensos são bons para refletir as emoções de um personagem quando ele está passando por momentos difíceis na vida. É claro que, ao lidar com essas questões, você deve tratá-las com respeito e ter cuidado para não criar situações que as tornem ridículas. Queria especialmente colocar o jogador em uma posição onde está lutando e tentando fazer as coisas melhores para o personagem que ele está interpretando. Minha intenção era fazer o jogador sentir que mesmo que algumas coisas sejam inevitáveis, você sempre pode melhorar a sua situação e a situação das pessoas ao seu redor.

  • Existe algo pessoal e real sobre a Mother?

Felizmente, não!

  • Como foi implementar as criaturas na jogabilidade? Quais foram as dificuldades em manter a rotina das crianças e a intrusão de monstros dentro do apartamento?

Usar IA para criar uma jogabilidade interessante é algo que sempre gosto de fazer em meus jogos. Para este, queria que o jogador sentisse que sempre há um intruso na casa. Eu queria que a criatura andasse bem rápido e evitasse o jogador, para que ele pensasse que nunca poderia dar uma boa olhada nela. Permitir que o jogador observe a criatura por muito tempo arriscaria quebrar a imersão/medo.

Para a IA das crianças, eu queria que o jogador tivesse algum controle sobre seu comportamento, mas ao mesmo tempo, às vezes, eles trabalhariam contra você. Acho que dar a eles um pouco de personalidade rebelde ajuda a dar-lhes mais caráter. Fazer a criatura e as crianças funcionarem e interagirem juntas em um sistema foi uma das partes mais desafiadoras de fazer o jogo.

  • Mother tem um conceito bastante minimalista, mas consegue ser um tanto profundo e complexo. Como funcionou seu processo criativo e quais foram suas maiores inspirações?

Comecei projetando e prototipando várias ideias que tinha e as testei para ver se gostava delas ou não e se se encaixavam no jogo. Percebi que muitas vezes você pode ter ideias para um jogo, mas uma vez que elas são implementadas, elas não são tão boas quanto você pensava que seriam. Acho que é sempre importante tirar do jogo tudo o que é supérfluo e apenas manter o que realmente funciona. Alguns jogos de terror indie são extremamente eficazes, mas também muito simples no conceito, como Nun Massacre, por exemplo. É tudo uma questão de execução e criação de um clima coerente para o jogo.

  • Como você vê o terror hoje, seja nos videogames, na literatura ou no cinema? Você está satisfeito com as produções recentes? Qual foi o último terror que realmente assombrou você?

Sinto que o gênero de terror em filmes e jogos está se renovando e crescendo em maturidade. Com filmes, acho que muitos diretores estão percebendo que o terror é mais uma emoção do que um gênero, e que pode ser aplicado a quase qualquer história. Eles não usam o terror apenas para serem assustadores, mas sim para mostrar o estado de espírito de seus personagens. Muitos filmes de terror recentes, como Midsommar ou O Farol, vão nessa direção e, embora não tenham me deixado aterrorizado, pareciam experimentos novos. Estou muito animado para ver onde essa tendência atual irá.

Com os jogos, sinto que agora estamos começando a perceber o seu potencial para criar medo. Acredito que um dia seremos capazes de fazer jogos tão assustadores que a maioria das pessoas não terá permissão para jogá-los, especialmente em realidade virtual. Minha experiência assustadora mais recente foi provavelmente o filme Hereditário, que saiu em 2018.

  • Essa estética da geração de 32-bit teve uma grande ressurreição ultimamente, especialmente no terror. Por que você seguiu por esse caminho? E por que você acredita que esse movimento está acontecendo?

Como um desenvolvedor independente com poucos recursos, pode ser ousado criar uma direção visual coerente para o seu jogo. Estilizá-lo é uma boa maneira de tornar seu mundo mais coerente e também mais rápido de produzir. Especialmente para os jogos de terror, o estilo de arte do primeiro PlayStation cria formas ambíguas e às vezes irreconhecíveis, que ajudam a criar a sensação de que o mundo e seu personagem são como um sonho (ou melhor, como um pesadelo). É um ajuste muito bom.

Essa nova estética é uma progressão natural da arte 2D em pixels. Acho que isso se deve ao fato de os jogadores estarem cansados de ver muitos pixel art 2D e a ferramentas como Unity e Unreal evoluírem e permitirem que os desenvolvedores criem gráficos 3D mais complexos com mais rapidez e facilidade. Pessoalmente, espero que isso inspire novos visuais que não apenas copiem o que foi feito no passado, mas também criem novos estilos que não vimos antes.

  • Qual a sua relação com o gênero terror? Você pretende desenvolver outros títulos de terror?

Horror, e em geral sentir medo, é uma das emoções mais intensas que você pode sentir, na minha opinião. Com certeza explorarei mais o gênero, embora não esteja excluindo outros tipos de histórias.

  • Com o jogo lançado e olhando para trás, do que você mais se orgulha em Mother e o que gostaria de poder mudar?

Como este é meu primeiro jogo, estou orgulhoso de ter conseguido pegar uma ideia e entregar um produto finalizado que mais ou menos corresponda a ela. O fato de os jogadores estarem gostando torna isso ainda mais satisfatório. É claro que gostaria de mais tempo para adicionar mais detalhes e mais polimento ao jogo mas acho que em algum momento tive que definir um limite, ou um prazo para a quantidade de trabalho que coloquei, porque sempre há mais detalhes a adicionar e coisas que eu poderia fazer melhor. No final, estou muito satisfeito com o resultado. No entanto, agora quero fazer melhor no meu próximo jogo.

  • Qual é a obra-prima do terror para você?

Ainda não experimentei tudo que o terror tem a oferecer, mas até agora tenho que dizer que é Audition, do diretor Takashi Miike. Recomendo assistir às cegas, porque é um daqueles raros filmes que consegue realmente te surpreender.

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Apesar de não saber interagir com jovens, dedica quantidades insalubres de seu tempo ao entretenimento eletrônico, tal qual Fantasma na Máquina, e sua faceta macabra, a preferida, se faz razão para continuar. MACABRA™ - FEAR IS NATURAL.