Inspirações reais para monstros do horror

E se monstros dos filmes de terror convivessem conosco na natureza? Dan Eatherley, naturalista e consultor ambiental, fez algumas equivalências assustadoras entre monstros fictícios e organismos reais.

Histórias arrepiantes, mistérios sinistros, crimes que chocaram o mundo… a vida real tem muita matéria-prima para enriquecer a ficção. Mas e quando os monstros, que pensamos terem sido criados a partir dos piores pesadelos, também encontram suas bases em um tecido muito mais palpável do que aquele de que são feitos os sonhos?

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Dan Eatherley é escritor, naturalista e consultor ambiental. Em 2019 lançou o livro Invasive Aliens, onde tenta mostrar como espécies que não são naturalmente das ilhas britânicas, esses “aliens invasores”, acabaram encontrando morada ali ao longo dos anos — enquanto as conquistas aconteciam entre os humanos em terra, animais, plantas, fungos e outros seres vivos também batalhavam para se instalarem em locais que não pertenciam.

Ao site Fandom, Eatherley especulou algumas criaturas reais que poderiam ter servido de inspiração para alguns monstros da ficção. Mesmo que estas criaturas não sejam exatamente de conhecimento dos produtores dessas obras, é assustador imaginar que eles podem existir no mesmo ambiente que os humanos, e que não sejam somente parte da imaginação de cineastas e roteiristas de terror.

Facehugger

Filme: Alien, o Oitavo Passageiro, 1979 // Uma das criaturas mais aterrorizantes da ficção científica, o Facehugger, da franquia Alien, mete medo em qualquer um. Uma criatura cheia de membros, que pode agarrar seu rosto e depositar seus ovos em nosso sistema — com um nascimento bem doloroso, é preciso mencionar — é, realmente, algo a se temer.

A lula-vampira-do-inferno (esquerda) e ocaranguejo-aranha-gigante (direita)

Para Eatherley, o Facehugger, em relação à sua aparência, poderia ser uma mistura entre uma lula-vampira-do-inferno (Vampyroteuthis infernalis), um cefalópode que vive nas profundezas dos oceanos Pacífico e Atlântico, e o caranguejo-aranha-gigante (Macrocheira kaempferi), conhecido como o maior artrópode conhecido, podendo chegar aos 3,8 metros com as patas esticadas e aos 19 kg. 

Uma vespa da família Ichneumonidae

Já em relação a sua forma de existência, que é parasitária, o cientista acredita que o Facehugger se aproxima das vespas parasitas, como as da família Ichneumonidae, uma família de importantes parasitas que, de acordo com a Wikipedia, utilizam como hospedeiros larvas e pupas de coleópteros, himenópteros e lepidópteros. Esse tipo de parasita acaba matando seus hospedeiros em determinado momento de suas vidas.

Yautja

Filme: O Predador, 1987 // A franquia Predador nos apresentou um outro vilão bastante aterrorizante e perigoso: vindo de fora da Terra, a raça dos Yautja são caçadores intergalácticos que possuem alta tecnologia e um sistema poderoso de camuflagem, além, é claro, da visão térmica.

Eatherley afirma que diversos animais possuem sistemas de camuflagem para se livrarem de predadores em seus ambientes naturais, mas talvez o que mais se aproxime da ideia de camuflagem dos Yautja seja o polvo-mímico (Thaumoctopus mimicus), que não somente tem a habilidade de mudar de cor, como também altera a própria textura corporal para se disfarçar no ambiente. Além disso, ele tem a sinistra habilidade de tomar a forma de diversos objetos e animais. De acordo com a wikipedia, ele é o único animal marinho conhecido que pode imitar tantos animais. 

O polvo-mímico (esquerda) e uma cascavel (direita)

Já sobre sua visão térmica, o cientista compara os Yautja com a família Crotalinae, mais especificamente com cascavéis. Essa família de víboras têm células sensíveis ao calor perto de suas narinas e olhos, em pequenos canais (ou fendas, que em inglês podem ser chamados de pit, e por isso outro de seus nomes são pit vipers), que basicamente transformam essa sensibilidade ao calor em visões. Então, essas cobras conseguem ver o calor por causa de suas células. 

As Criaturas de Um Lugar Silencioso

Filme: Um Lugar Silencioso, 2018 // Os fãs de terror ficaram em polvorosa quando o filme de John Krasinski foi lançado. O grande inimigo da família sobrevivente em um mundo apocalíptico eram as criaturas que, apesar de não terem olhos, tinham um reflexo muito apurado quando ouviam algum barulho — e tinham, também, um visual bem assustador.

Orca, que ficou popularmente conhecida como a baleia assassina

Eatherley compara essa sensibilidade aos sons com a Orca (Orcinus orca), um mamífero da família dos golfinhos — que, inclusive, já ganhou seu próprio filme de terror em 1977 — e que ficou popularmente conhecida como a baleia assassina. As Orcas, diferente das criaturas de Um Lugar Silencioso, como explica o cientista, têm olhos. Mas seu sonar é muito mais poderoso, podendo alcançar presas em até 500 pés de distância, o que equivale a quase 153 metros. 

Bioraptors

Filme: Eclipse Mortal, 2000 // Depois de um acidente com a nave onde estavam, os poucos sobreviventes da tragédia acabam em um planeta até então inexplorado. Porém, o local não está vazio. Lá vivem estranhos monstros, e os sobreviventes do acidente terão que lutar mais uma vez para sobreviver. O filme de David Twohy, que faz parte de uma série de filmes e jogos para videogame que ficou conhecida como As Crônicas de Riddick, fez um pouco menos sucesso que os outros da lista, mas apresentou uma criatura tão mortal quanto eles: os Bioraptors. Os monstros de Eclipse Mortal têm três grandes características que Eatlherley analisou separadamente: a ecolocalização, sentir o cheiro de sangue para atacar, e fotossensibilidade. 

Morcego (esquerda), um mosquito (ao centro), e um rato-toupeira-pelado (direita)

Em relação à primeira, o cientista compara os Bioraptors aos morcegos que, assim como as criaturas do filme, geralmente vivem em cavernas e caçam em grupos pequenos. Já sobre sentir o cheiro de sangue, as possibilidades de comparação são o mosquito, que tem a habilidade de detectar dióxido de carbono, suor e calor corporal, ou mesmo um tubarão, que tem tecidos olfativos chamados lamelas em aberturas respiratórias, conseguindo fazer com que seu olfato seja muitíssimo apurado, facilitando bastante na caça. E, sobre a fotossensibilidade, Eatherley compara com o rato-toupeira-pelado, uma criaturinha muito sensível à luz que vive debaixo da terra, principalmente na África.

Graboids

Filme: O Ataque dos Vermes Malditos, 1990 // Uma cidadezinha pequena, cercada por deserto de todos os lados, se vê ameaçada quando uma estranha força da natureza começa a se remexer embaixo da terra. Os Graboids, as criaturas assustadoras de O Ataque dos Vermes Malditos, são uma ameaça quase invisível: subterrâneas, elas podem atacar em qualquer lugar e a qualquer momento, e sentem a vibração de suas presas mesmo abaixo da superfície.

Exemplo de quetognata.

Como explica Eatherley, várias espécies têm essa habilidade especial. Escorpiões e aranhas são os exemplos mais óbvios. Aranhas, por exemplo, podem chegar a ter 3000 sensores de tensão em seus corpos, e com a menor vibração ficam alertas. Mas há um invertebrado que se aproxima bastante dos Graboids: as criaturas agrupadas no filo quetognatas (Chaetognatha). Esses seres podem medir de 3 mm e 12 cm e tem dois conjuntos de espinhos na cabeça, dos quais são usados para capturar suas presas — são carnívoros. O cientista afirma que os quetognatas “são predadores que se alimentam principalmente de crustáceos chamados copépodes, usando seu sentido vibratório aguçado para caçar presas e engoli-las inteiras”.

A Bolha

Filme: A Bolha Assassina, 1988 // Meg Penny e Brian Flagg estavam seguindo suas vidas (separadamente) muitos felizes e tranquilos, cada um fazendo suas coisas, quando o destino tratou de uni-los em uma missão: sobreviver a uma estranha bolha espacial que poderia destruir a cidade inteira. A Bolha Assassina é um remake do filme de mesmo nome de 1958. Em ambas as produções, temos nosso vilão em uma bolha gelatinosa e muito mortal.

Jamais imaginaríamos que uma figura assim pudesse ter um equivalente no mundo real, não é? Mas a natureza é essa caixinha de surpresas. Eatherley chama a atenção para o Bolor limoso ou, como também é conhecido, fungo mucilaginoso. São organismos eucariotas, que não compartilham exatamente a mesma família ou filo, que podem viver como organismos unicelulares livres, mas que se unem para formar “massas mucilaginosas macroscópicas para formar estruturas reprodutivas multicelulares” sobre uma superfície de matéria orgânica em decomposição. Apesar de serem microscópicos, essa habilidade de formarem essa massa mucilaginosa se assemelha ao vilão de A Bolha Assassina.

Triffids

Filme: O Terror Veio do Espaço, 1963 // Baseado no livro de John Wyndham, O Terror que Veio do Espaço já ganhou três versões. A história é a seguinte: certo dia, o mundo parou para assistir a uma chuva de meteoros, um espetáculo belíssimo. O problema é que o show acabou causando a cegueira da maioria das pessoas. Os poucos que restaram com visão puderam acompanhar outro terror de perto: plantas espaciais que estão se alimentando de humanos e animais. 

Hogweed gigante

Sabemos que plantas carnívoras existem. Mas, com exceção de Audrey II, de A Pequena Loja dos Horrores, é difícil encontrarmos plantas que comam humanos. Mesmo assim, Eatherley sabe uma coisa ou duas sobre plantas perigosas. Em seu livro Invavise Aliens, inclusive, ele escreveu sobre uma delas.  Conhecida nas ilhas britânicas como Hogweed gigante (Heracleum mantegazzianum), essas plantas eram naturais da Ásia, e foram levadas até a Grã-Bretanha pelos caçadores de plantas e naturalistas no século XIX, e foi plantada até mesmo no jardim do Palácio de Buckingham. De início, como conta o cientista, tudo correu bem. Mas, lá por 1970, tudo desandou: crianças começaram a aparecer com terríveis feridas em volta dos olhos e da boca. O que acontece é que eles estavam cortando os hogweeds e usando seus caules grossos e ocos como binóculos e zarabatanas em sua brincadeira. Quando cortados, os hogweeds liberam uma seiva que, quando exposta à radiação ultravioleta da luz solar, causa uma reação e provoca erupções cutâneas. Logo as hogweeds foram considerados os triffids da vida real.

O alienígena metamorfo

Filme: O Enigma de Outro Mundo, 1982 // Em uma base dos Estados Unidos na Antártida, um grupo de cientistas terá suas vidas em risco quando um terrível alien metamorfo começa a se transformar em cada um da equipe. Um dos maiores clássicos do terror, o filme de John Carpenter aterroriza por seus efeitos práticos muito bem produzidos e seus momentos de puro horror. O alien metamorfo de O Enigma de Outro Mundo utiliza uma forma de controle mental em seus hospedeiros, o que deixa tudo ainda mais assustador.

Imagens de um “ataque” do parasita fungo-formiga-zumbi (esquerda) e de um verme-crina-de-cavalo (direita)

No mundo real, por mais terrível que isso possa parecer, não é incomum que parasitas consigam “controlar” a mente de seus hospedeiros. Em especial o fungo-formiga-zumbi (Ophiocordyceps unilateralis), que infesta o corpo de insetos (na maior parte formigas) de florestas tropicais, passa cerca de 9 dias se desenvolvendo dentro deste corpo, e depois faz com que este corpo vague para fora de sua área de segurança, geralmente uns 25 cm em uma árvore, com a umidade certa para o crescimento do fungo. De acordo com o cientista, “a formiga então agarra uma folha com suas mandíbulas e morre. Dentro de 24 horas, fios de fungos emergem do cadáver. Finalmente, um talo sai da formiga e começa a chover esporos no chão da floresta tropical, onde podem infectar mais formigas”.

Há também a comparação com os vermes-crina-de-cavalo (Nematomorpha). Encontrados geralmente em água fresca, se hospedam em mosquitos enquanto larvas e esperam que um gafanhoto seja seu hospedeiro final. Quando atingem o desenvolvimento, controlam a mente dos corpos de seu hospedeiro e fazem com que ele cometa suicídio se jogando em outro ponto de água fresca, para o ciclo recomeçar.

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Aterrorizante, ein? Aqui na Macabra nem sabemos dizer qual parece mais assustador. Qual outro organismo natural poderia inspirar monstros dos filmes de terror? Comente com a Macabra no Twitter e Instagram.

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Acordo cedo todos os dias para passar o café e regar minhas plantas na fazenda. Aprecio o lado obscuro da arte e renovo meus pactos diariamente ao assistir filmes de terror. MACABRA™ - FEAR IS NATURAL.