O que faz de Ed Wood o melhor pior diretor de todos os tempos

Ed Wood deu vida a filmes estranhos e excêntricos, mas muito autênticos. Conheça os filmes essenciais do cineasta.

Ed Wood foi um artista incansável que fez um pacto com a liberdade para se expressar por inteiro, e fazer cinema de corpo e alma. Entrou para a história ao se destacar entre os piores diretores de todos os tempos, mas foi capaz de erguer sozinho um universo em preto e branco cercado de sombras dramáticas, erros técnicos, linhas de nylon, maquetes toscas, atuações amadoras, transbordando clichês e efeitos especiais dignos de uma feira de ciência da quinta série. Alheio às críticas e aos insultos, a paixão de Wood transformou seus discos voadores, zumbis, vampiras e strippers no mais puro fascínio entre o público.

Edward D. Wood Jr. nasceu em 1924 no estado de Nova York e chegou a servir durante a Segunda Guerra Mundial. De volta aos Estados Unidos, ele se mudou para Hollywood em 1947, onde começou a escrever roteiros e a dirigir pilotos de programas de TV, comerciais e vários faroestes de baixo orçamento que foram esquecidos com o tempo.

Poucos anos depois ele se tornou amigo de ninguém menos do que o ator Bela Lugosi, famoso por interpretar Drácula no cinema e outros filmes de terror. Apesar dos comentários do filho do ator de que Edward explorava seu pai pela fama do passado e por estar num ponto da carreira em que não podia recusar trabalho, muitos documentos e entrevistas sugerem que ali existia uma amizade verdadeira, e não apenas uma troca de interesses por trabalho e exposição. Além disso, dizem que Wood ajudou o ator quando ele estava com depressão e viciado em morfina.

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O estilo de trabalho de Ed Wood

Fã declarado de Orson Welles, Wood decidiu que ele também seria um cineasta multifunção: produtor, roteirista e diretor — em alguns casos até ator. O problema é que ele era incrivelmente incompetente nestes três cargos. Amigos costumavam descrevê-lo como uma figura excêntrica e picareta, muito mais interessado em montar um filme do que aprender a fazer cinema propriamente.

Todos os seus filmes são marcados por continuidade sem lógica, narrativas bizarras e economia de material por questões orçamentárias. Em Plano 9 do Espaço Sideral é possível ver os cabos sustentando as naves espaciais, atores derrubando pedras de papelão, carros que mudam de modelo e ano nas sequências de perseguição, cenas que mostram a clara falta de segurança em relação a armas e o uso de cortinas de chuveiro em cabines de avião que não possuem equipamento algum. 

Aliás, foi durante o período de gravações de Plano 9 que o ator Bela Lugosi faleceu. Na época, a melhor saída possível seria fazer um casting cuidadoso com um ator que fosse razoavelmente parecido com o falecido. Mas Ed Wood achou que economizaria mais tempo chamando o seu dentista. Novamente: ele considera este o seu melhor filme.

Pouco reconhecido em vida, Ed Wood passou a chamar a atenção na década de 1980, após seu falecimento. Diferentemente dos artistas à frente do seu tempo, o motivo para isso ocorrer não foi muito honroso: ele foi considerado o pior diretor de todos os tempos, o que gerou curiosidade e um certo fascínio do público.

Vida pessoal e estilo único

Uma característica que chamava a atenção dos colegas do diretor era se vestir com roupas de tecido angorá, naquela época considerado bem feminino. Esta peculiaridade foi retratada no filme Ed Wood (1994), dirigido por Tim Burton. A predileção pelo tecido era tão grande que um de seus pseudônimos era Ann Gora.

Mas o angorá não era a característica que mais chamava a atenção sobre Ed Wood. Ele era um verdadeiro entusiasta de se vestir com roupas femininas. O motivo, segundo sua esposa Kathy O’Hara, tinha relação com o fato da mãe dele o vestir como menina quando ele era pequeno. Um colega dos tempos de exército afirmou que ele usava sutiã por baixo do uniforme durante a guerra.

A inclinação de Edward por roupas femininas não tinha, no entanto, nenhuma inclinação sexual. Ele sempre se identificou como heterossexual e manteve relacionamentos com mulheres, o que não o impedia de também sair em público vestido como Shirley, seu alter-ego drag. [Se hoje o tema ainda gera polêmica, imaginem isso em 1950.]

5 filmes essenciais de Ed Wood (se possível)

Em sua desastrosa carreira, Wood atuou muito mais como roteirista do que como diretor. Entre filmes, curtas, séries e programas de TV ele escreveu 82 produções e foi diretor de 46. A seguir elencamos algumas obras fundamentais para compreender sua trajetória e personalidade:

1. Glen ou Glenda? (1953)

Em 1953 ele dirigiu uma cinebiografia baseada em Christine Jorgensen, uma das primeiras mulheres transexuais a se submeter à cirurgia. A produção acabou ganhando conotações autobiográficas para Ed Wood, já que um dos temas que o filme se propõe a elucidar é sobre transexualidade não ter relação com homossexualidade. Ele estrelou o próprio filme sob o pseudônimo de Daniel Davis. Bela Lugosi participou como cientista narrador. Ed Wood considerava este o seu trabalho mais autoral.

2. A Noiva do Monstro (1955)

Produzido e dirigido por Wood, este filme de terror foi baseado em uma história criada pelo produtor Alex Gordon, que era amigo de Ed. O longa de pouco mais de 1h de duração foi estrelado por Bela Lugosi, pelo lutador sueco Tor Johnson e pela atriz Loretta King, com quem o diretor teve um relacionamento. O enredo lembra bastante a história de Frankenstein, com a diferença de que o cientista louco queria criar um super-homem atômico.

3. Plano 9 do Espaço Sideral (1959)

Escrito, produzido e dirigido por Wood, Plano 9 do Espaço Sideral foi a obra preferida do cineasta e o último trabalho de Bela Lugosi. Também é o filme mais conhecido de Ed Wood, apesar da limitada distribuição em sua estreia nos cinemas. A audiência veio porque o estúdio conseguiu vender o filme para exibição tarde da noite em um canal de TV. Na mesma premiação em que ele recebeu o infame prêmio de pior diretor do mundo, o filme foi considerado o pior de todos os tempos.

4. Orgia da Morte (1965)

Este aqui é praticamente a antologia do terror dos infernos. O filme começa recriando a cena de abertura de Noite das Assombrações, produção do diretor que ainda não havia sido lançada. O cenário é um cemitério coberto por névoa, onde o Senhor dos Mortos e sua acompanhante sexy comandam uma série de performances macabras de mulheres seminuas — recrutadas por Wood em um clube de strip-tease local. A produção ainda tem um lobisomem e uma múmia. Um filme com essas credenciais nem precisa de roteiro.

5. Necromania (1971)

Em 1970, Ed Wood fez seu primeiro filme pornô: Take it out in trade. No ano seguinte, ele produziu, escreveu e dirigiu Necromania sob o pseudônimo Don Miller. O filme foi uma espécie de pioneiro no subgênero de “pornografia hardcore”. Por muitos anos pensou-se que o material estivesse perdido, mas ele reapareceu no final dos anos 1980 em uma versão editada e foi relançado em DVD em 2005.

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Em homenagem a esse grande cineasta, que também foi um prolífico escritor, a DarkSide Books lançou o livro Ed Wood: Contos e Delírios, que reúnem alguns dos contos mais excêntricos dessa faceta de Wood. O livro ainda conta com ilustrações de Laerte e um prefácio de Paulo Biscaia Filho. Uma oportunidade de entrar ainda mais fundo na mente de uma das figuras mais estranhas dos filmes B, uma jornada inigualável. O livro já está em pré-venda na Loja Oficial da DarkSide Books.

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Renunciei à vida mundana para me dedicar às artes da trevas. No meu cálice nunca falta vinho ungido e protejo minha casa com gatos que afastam os espíritos traiçoeiros. MACABRA™ - FEAR IS NATURAL.