Metade homem, metade inseto: os bastidores macabros de A Mosca

Com sua maquiagem aterrorizante e atuações brilhantes, A Mosca se tornou um sucesso. Listamos algumas curiosidades sobre o filme de David Cronenberg.

Um cientista, que tem trabalhado duro em uma máquina para teletransportar objetos, acaba sofrendo as consequências de sua própria descoberta. Ao acordar de sonhos intranquilos, Seth Brundle se descobriu mosca.

Lançado em 1986 e dirigido por David Cronenberg, a partir do roteiro de Cronenberg com Charles Edward Pogue, A Mosca se tornou um dos grandes filmes de ficção científica dos anos 1980, e um dos maiores exemplos do horror corporal que Cronenberg poderia realizar, elemento que já era tradicional do diretor, mas que atingiu uma outra marca com a produção. Diferente dos outros filmes de Cronenberg, A Mosca acabou teve um orçamento e um alcance de público maior — e foi um sucesso de crítica.

Para os fãs de Brundlefly e companhia, listamos algumas curiosidades da produção.

Remake mais famoso

A Mosca, na verdade, é um remake do filme de 1958, dirigido por Kurt Neumann, com roteiro de James Clavell e adaptado a partir do conto de George Langelaan. Na versão original, A Mosca da Cabeça Branca, protagonizada por David Hedison, Patricia Owens e Vincent Price, o cientista Andre Delambre (Hedison) é encontrado morto, com sua cabeça e um dos braços esmagados em uma prensa hidráulica. Sua esposa, Helene (Owens), confessa ter cometido o crime, mesmo não querendo esclarecer os motivos. Entretanto, algo estranho parece estar acontecendo, pois a mulher se torna obcecada por moscas. François (Price), irmão de Andre, encontra uma mosca com a cabeça branca e a leva até Helene, que conta a história como realmente aconteceu. 

Neste ponto, as histórias se tornam bastante parecidas: uma máquina de teletransporte que, ao ser testada pelo cientista, acabou com uma mosca intrusa atrapalhando o procedimento. O homem e a mosca acabam mesclando seus corpos. Os anos 1950, quando o filme foi lançado, ficou reconhecido por seus filmes de terror com motivos científicos e tecnológicos. Apesar de não ter o nível de horror corporal que David Cronenberg utilizou em sua versão, é de se imaginar que, para a época, ver um homem com uma cabeça de mosca possa ter sido bastante sinistro.

A escolha de Cronenberg

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De cara, os produtores queriam que Cronenberg dirigisse A Mosca. Em seus tempos de faculdade, Cronenberg estudou entomologia, e isso o deixou particularmente interessado no projeto. Entretanto, na época em que A Mosca iria iniciar sua produção, o diretor estava ocupado participando do projeto Vingador do Futuro. Mel Brooks, um dos produtores de A Mosca com seu estúdio Brooksfilms — o mesmo estúdio que produziu O Homem Elefante, de David Lynch —, acabou contratando o diretor inglês Robert Bierman.

Infelizmente, enquanto estava de férias na África do Sul, a filha de Bierman sofreu um acidente e acabou falecendo, o afastando da direção. Cronenberg não estava mais trabalhando em Vingador do Futuro, que acabou sendo dirigido por Paul Verhoeven, e aceitou a direção de A Mosca. Bierman acabou se tornando reconhecido por dirigir Um Estranho Vampiro, com Nicolas Cage.

Os Atores

Antes de A Mosca, Jeff Goldblum já havia participado de alguns filmes, com destaque para Invasores de Corpos, de 1978, e O Reencontro, de 1983, mas ele não era a imagem de protagonista que os produtores tinham em mente. Entretanto, Cronenberg imaginou que o papel cairia muito bem nele: um cientista louco, com alguns trejeitos e um certo charme excêntrico.

Mesmo com Goldblum na cabeça, o papel foi oferecido a outros atores, como Richard Dreyfuss, Willem Dafoe, James Woods, Mel Gibson e Michael Keaton.

Na época, Geena Davis era namorada de Jeff Goldblum, com quem ensaiou algumas falas de A Mosca. Os dois já haviam trabalhado juntos anteriormente no filme de comédia Transilvânia – Hotel do Outro Lado do Mundo. Apesar da relutância de Cronenberg em aceitar um casal real como atores em papéis de um casal na ficção, ele acabou cedendo e ambos contracenaram juntos novamente, como Seth Brundle e Veronica Quaife.

É bastante comum que Cronenberg apareça em algum momento em seus próprios filmes — e diversas vezes em outros filmes também, tendo atuado em uma ou outra produções, como Raça das Trevas, de Clive Barker —, mas a ideia de que ele fizesse o papel de ginecologista foi de Geena Davis, que afirmou ficar mais confortável com o diretor fazendo esse papel. 

A Produção

São feitas várias referências ao longo do filme, de obras da literatura até à própria obra original. Um dos diálogos de A Mosca da Cabeça Branca, em que o personagem principal pede por ajuda, por exemplo, foi recriado. A fala “I’m saying, I’m an insect who dreamt he was a man and loved it, but now that dream is over, and the insect is awake” (“Eu estou dizendo, eu sou um inseto que sonhou que era um homem e amou isso, mas agora aquele sonho acabou, e o inseto está acordado”), é inspirada na história “O Sonho da Borboleta”, de Chuang Tzu, bem como em Metamorfose, de Franz Kafka.

A criação da mosca, entretanto, foi uma das partes mais complicadas do filme. Para a baba da mosca, foi utilizada uma mistura de ovos, mel e leite. O “Brundlefly”, em sua maquiagem final, levava cerca de 5 horas de aplicações. Chris Walas, responsável pela maquiagem do filme, considerava que seria muito difícil adaptar o conceito da maquiagem ao rosto de Goldblum mas, no final, tudo deu certo. Ao escolher quais trejeitos o boneco final da transformação completa de Brundle em mosca deveria ter, para que pudesse ser facilmente reconhecido, Goldblum escolheu seus tiques nervosos e pausados. Sem dúvida, é possível reconhecer os traços de Goldblum no boneco.

Várias sequências foram retiradas da edição final. Algumas delas, por exemplo, se referiam aos sonhos finais de Veronica, quando ela já estava grávida de Brundle. Diversos finais também foram gravados, mas Cronenberg avaliou melhor e assumiu que o final atual do filme era a melhor escolha.

Após a estreia

O filme acabou sendo um sucesso, mesmo sendo tecnicamente um remake, e vindo de um diretor um pouco controverso. A atuação de Goldblum foi extremamente positiva entre os críticos e os espectadores, e chamou a atenção para o ator. 

Cronenberg admitiu ficar um pouco surpreso quando alguns dos críticos, após assistirem ao filme, se referirem a ele como uma metáfora para a AIDS. Para Cronenberg, seu trabalho em A Mosca estava ligado a todas as doenças terminais, mesmo o câncer, e principalmente o envelhecimento.

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Chris Walas e Stephan Dupuis foram indicados ao Oscar de Melhor Maquiagem e ganharam. Também foram indicados na mesma categoria no BAFTA. No Saturn Award, o filme foi indicado nas categorias de Melhor Ator, Melhor Atriz, Melhor Maquiagem, Melhor Diretor e Melhor Filme de Terror, vencendo o prêmio de Melhor Maquiagem e Melhor Filme de Terror.

A Mosca 2

Uma sequência foi produzida, intitulada A Mosca 2, em 1989, dirigida por Chris Walas e com roteiro de Mick Garris, Jim e Ken Wheat. No filme, o filho de Brundlefly e Veronica Quaife procura pela cura de sua mutação. A produção acabou sendo um fracasso.

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Acordo cedo todos os dias para passar o café e regar minhas plantas na fazenda. Aprecio o lado obscuro da arte e renovo meus pactos diariamente ao assistir filmes de terror. MACABRA™ - FEAR IS NATURAL.